Dentre as evoluções constantes da indústria automobilística, destaco a supressão daquela tranca manual que fechava a porta. Coisa desagradável era esquecer as chaves do carro na ignição e fechar a porta empurrando o botão para baixo. Geralmente era fixado bem próximo da janela lateral. Só nos dávamos conta da gafe quando tudo já estava trancado. Algumas pessoas tinham o dom de enfiar um barbante com um laço e puxar o botão trancador, habilidade que nunca consegui desenvolver. Outros, dependendo do veículo, aqueles que tinham o quebra-vento, conseguiam enfiar um arame e zás, resolviam o problema. Também fracassei nas tentativas. Na falta de alguém próximo com tais habilidades, a solução era quebrar a ventarola e assumir o prejuízo. Em duas oportunidades, de modo especial, tranquei a porta sem querer. Na primeira vez, indo de Alegrete para Caxias, ao ultrapassar um caminhão boiadeiro, fui brindado pela descarga intestinal de uma vaca. A sujeira no pára-brisas e na lateral do carro reclamavam uma lavagem completa. Foi o que fiz ao chegar em São Gabriel, no primeiro posto de serviços que encontrei. Jatos dágua tiraram a sujeira e a fedentina, mas na hora da partida, surpresa, a chave estava na ignição e a porta estava trancada. Ninguém por perto que soubesse abrir a maledeta. Não tive dúvidas em pegar uma pedra e quebrei a ventarola e retornei para a estrada, pois tinha muito chão pela frente. Mais adiante o tempo começou a fechar e eu não poderia continuar com o vidro quebrado. Consegui chegar numa agência da Volkswagen em Rio Pardo antes do final do expediente para repor o vidro quebrado. Naquela época as agências tinham estoques de peças, coisa que hoje já não é tão comum. Preparado, voltei para a estrada e a providência foi salutar pois desandou um temporal daqueles. A segunda vez foi em São Leopoldo. Estacionei, visitei um cliente e no retorno a mesma surpresa. Quando me preparava para quebrar o vidro, habilidade que eu já começava a dominar, aproximou-se um rapaz e vendo a minha dificuldade me disse:
- Paga uma cerveja que eu abro a porta.
- Combinado, respondi.
Não demorou nem um minuto e a porta estava aberta, com o sujeito munido apenas de um barbante. Antes, outras pessoas já tinham se aproximado e diante da proposta do rapaz, várias pessoas permaneceram por ali apreciando a arte manual do próprio. Quando ele terminou o “serviço”, com o maior prazer gratifiquei-o não com o valor, não de uma mas de duas cervejas. O inusitado ficou por conta de um gaiato que estava por ali e comentou:
-Tchê, tu faz isto por diversão ou por profissão?
Não fosse um providencial pedido de desculpas, eu presenciaria uma tremenda briga, tamanha era a indignação do meu socorrista.
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