Charge de Gerson Kauer |
A impossibilidade do
reconhecimento de assinatura digital
O local foi o escritório de
atuante advogado, ex-magistrado de carreira, aposentado há menos de cinco anos.
Na florescente banca advocatícia
estava em período experimental um estagiário que aportara havia duas semanas,
com uma bagagem de excelentes notas na faculdade, mas “zero” de malandragem
forense. Ele ainda não justificara o Q.I. com o qual se apresentara para fazer
o estágio.
Não se trata, no caso, do Q.I.
“quociente de inteligência”, mas do conhecido Q.I., epíteto de “quem indica” e
que, no caso, tinha tido origem na corte.
Dois advogados novos da equipe
lidavam com a montagem da petição inicial de ação contra uma operadora de plano
de saúde, a ser movida por uma pessoa analfabeta. Esta apusera, na procuração,
a impressão digital de seu polegar direito. Um dos dois noveis advogados –
pretendendo pilheriar com o estagiário – deu-lhe a ordem:
– Vai ao tabelionato, para o
reconhecimento da assinatura digital! Se possível, por autenticidade.
O estagiário partiu para a
missão. Meia hora depois, ante a recusa dos atendentes notariais em fazer o
reconhecimento do polegar estampado, o estagiário – invocando o nome de seu
´padrinho´ – pediu para ser recebido pelo tabelião. Deste recebeu, na hora, uma
estrepitosa aula sobre mandatos, documentação digital etc.
Ao voltar, o estagiário foi
direto ao gabinete do advogado titular do escritório para reclamar da
humilhação que passara. No fim da tarde, toda a equipe foi reunida.
Primeiro, para proibir a
repetição de gozações no ambiente de trabalho. Segundo, para uma crítica aos
dois noveis advogados que haviam recolhido, sob a forma de impressão digital, a
assinatura da cliente analfabeta. “Só analfabetos jurídicos desconhecem que
seus congêneres analfabetos mundanos, por não saberem ler nem escrever, devem
outorgar procuração por instrumento público” – disse o jurisconsulto egresso do
tribunal de justiça.
Todos os presentes na sala foram
postos a ler e decorar os artigos nºs 653 a 666 do Código Civil: “Opera-se o
mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos
ou administrar interesses”...
Fonte: www.espacovital.com.br