José Horta Manzano
Pensei que, com a derrota do capitão e com o falecimento de seu mentor, a teoria do complô que deu vida à terra plana também teria caído no esquecimento. Parece que não. Vamos lá.
Semana passada saiu nova pesquisa Datafolha baseada na entrevista de mais de 2 mil brasileiros em 113 municípios do país. A pergunta era:
“Na sua opinião, qual é o formato do planeta Terra: redondo ou plano?”
Nove em cada dez entrevistados responderam “redondo”, mostrando estabilidade com o percentual aferido na pesquisa de 2019, quando a mesma pergunta tinha sido feita.
No entanto, a par desses que deram a resposta padrão, um punhado de cidadãos mostrou acreditar que a Terra é plana – e tiveram a coragem de afirmá-lo. Entre os bolsonaristas, 8% são dessa opinião. Entre os petistas, nada menos que 7% estão também convictos de que a Terra é plana. Se acrescentarmos os que não souberam responder, que são 2% entre bolsonaristas e 3% entre lulistas, chegamos a um total de 10% da população. São indivíduos que se encontram numa zona de insegurança cognitiva.
Se esses 10% estão longe de representar a maioria dos brasileiros, assim mesmo não deixam de representar um cidadão em cada dez. Não é uma franja tão desprezível. Por que essas pessoas terão aberto os braços para o ensino dessa estranha cartilha?
Que eu me lembre, não se falava em “Terra plana” décadas atrás. Esse assunto surgiu depois da vulgarização da internet. Antes disso, não era um ponto polêmico. A gente aprendia que a Terra era redonda e pronto. Seria descabido pôr em dúvida.
A internet permitiu a disseminação dessa teoria complotista. De lá deve ter vindo o alerta: “Ô galera, olho vivo! Estamos sendo enganados pelos bilionários pedófilos que dirigem o mundo. A Terra não é redonda, é plana! Qualquer um pode constatar isso a qualquer momento, em qualquer lugar. Olhe em torno de você e não se deixe enganar!”
Bolsonaristas não são donos exclusivos da internet; lulopetistas também têm acesso. Em razão disso, 10% de nossos compatriotas, de esquerda ou de extrema-direita, se deixaram contaminar pela dúvida. E hoje todo esse contingente tem suspeita (ou certeza) de que nosso planeta não é uma bola redonda, que está mais pra bola murcha e achatada.
À vista disso, pode-se concluir que o espírito acrítico capaz de aceitar qualquer bobajada não é monopólio do torcedor bolsonarista. Os fãs do lulopetismo têm, em igual medida, o mesmíssimo espírito acrítico. Os números não mentem: 10% de uns contra 10% dos outros.
Na realidade, só adquire crença em algo que não foi ensinado na escola quem teve pouca escola. Ou escola fraca. O terraplanismo brota num ambiente em que não entra a leitura. É o mesmo terreno em que surgem as demais teorias complotistas e complotizantes.
Parodiando o que se dizia nos anos 1940 e 1950 sobre a saúva:
Ou o Brasil acaba com a ignorância ou a ignorância acaba com o Brasil.
Fonte: brasildelonge.com
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