A Rádio Caxias funcionava no prédio do City Hotel, no centro da cidade. Em função das rádio-novelas e para levar ao ar programas ao vivo, a rádio tinha um pequeno auditório. Mesmo um menino ainda, algumas vezes andei por lá.
Mas o que eu gostava mesmo era de ver e ouvir um pianista que geralmente aos sábados tocava no bar do City Hotel. Digo aos sábados pois era quando andava pelas ruas da cidade antes ou depois do tradicional cinema.
O piano estava colocado junto a um janelão que dava vista para a Av. Julio de Castilhos. Não entendia e continuo não entendendo nada de música mas o som que chegava aos meus ouvidos sempre era agradável.
A estampa do tal pianista também chamava a atenção. Homem alto, nem magro, nem gordo, cabelos brancos e bem trajado, compunham um personagem daqueles vistos em filmes.
A leveza com que o pianista transitava pelas teclas do instrumento para mim era uma coisa meio mágica. Por vezes ele olhava para a rua sem parar de tocar e até nem sei se chegava a notar a minha presença.
Como era possível, me indagava, um sujeito executar uma música ao piano sem olhar para as teclas e mais, sem olhar para partitura alguma, pois não haviam partituras à sua frente. Aquilo tudo era muito estranho e mágico. Acho que Nestor Campagnolo era o seu nome. Pude vê-lo em outras oportunidades tocando com um conjunto, principalmente nos programas ao vivo, tanto no auditório da Rádio Caxias como nas manhãs de domingo no Cinema Imperial.
Anos mais tarde aprendi a tocar saxofone e acabei tocando num conjunto, animando reuniões dançantes nas domingueiras. Um colega de conjunto, que era mais velho do que os demais integrantes, conheceu o pianista e penso que chegaram a tocar juntos em alguma oportunidade.
Certa feita ele nos relatou que a capacidade musical daquele pianista estava muito além do que se via por aí. Seus dedos produziam acordes dissonantes muito próprios da Bossa Nova, muito tempo antes dela ter surgido. Enfim, era um músico de ponta. Pena que atuava no interior do interior.
Na opinião desse meu amigo, se aquele pianista tivesse se aventurado nos grandes centros e até no exterior, teria alcançado merecida fama.
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