Ruy Castro
O homem pisou na Lua em 20 de julho de 1969; Tom Jobim chegou lá dois anos e meio antes
Um LP cai-me às mãos num leilão: "Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim". É, claro, o disco de 1967, em que Frank Sinatra canta Tom Jobim, acompanhado pelo próprio. Não é um vinil difícil. A versão nacional abunda nos sebos. Mas este é o disco americano, importado, e, melhor ainda, por ser mais raro, em mono. Incrível como, até nos EUA em 1967, mesmo os discos de Sinatra vinham em versões mono e estéreo —o estéreo ainda não era universal. Mas o que o torna especial é o que vem escrito a tinta na contracapa.
"Aos meus amigos Carmelia e Jimmy, para constatarem a realização de parte dos nossos sonhos, que faziam parte [sic] das nossas reuniões no Clube da Chave, onde todas as noites vocês, eu, João Gilberto, Dolores Duran, Jonny [sic] Alf, Nanai, Vinicius e Donato éramos constantes, lembram-se? Do seu Tom Jobim."
Carmelia e Jimmy eram os cantores Carmelia Alves e seu marido Jimmy Lester, nome artístico de José Andrade Ramos. O Clube da Chave era uma boate em Copacabana, exclusiva de 50 grã-finos, boêmios, jornalistas e seus convidados. Durou dois anos: 1953-54. Tom, o desconhecido João Gilberto, Dolores, Johnny Alf, o violonista Nanai e o acordeonista João Donato eram alguns dos músicos que se revezavam. O poeta e diplomata Vinicius de Moraes ainda não cantava, só aplaudia. E gravar com Sinatra ou ser gravado por ele era um sonho tão inacessível quanto ir à Lua —talvez mais.
Mas, em fins de 1966, seduzido pelas canções que Tom já despejara no mercado americano, Sinatra convidou Tom a fazerem um LP para a Reprise, sua gravadora. Em três sessões, nas noites de 30 e 31 de janeiro e 1º de fevereiro de 1967, de 20h às 23h30, no estúdio Western Recorders, em Hollywood, gravaram-se as dez imortais faixas. Aquele LP era o sonho realizado.
O homem só pisaria na Lua no dia 20 de julho de 1969. Tom chegara a ela dois anos e meio antes.
Fonte: Folha de S. Paulo
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