terça-feira, 18 de julho de 2023

MEDO DE AVIÃO: ESPECIALISTAS EXPLICAM COMO CONTROLAR

Técnicas de respiração e conversar com os comissários podem ajudar a enfrentar a fobia

Passar horas dentro de uma aeronave não é muito animador para quase para ninguém. Mas, para algumas pessoas, só a ideia de levantar voo pode parecer uma tortura.

O medo de viajar de avião pode acontecer tanto com quem nunca voou quanto com aqueles que já passaram por alguma situação traumática durante um voo. É uma condição que envolve ansiedade e angústia, com consequências negativas para a vida da pessoa, como perder oportunidades de trabalho ou mesmo deixar de fazer a viagem dos sonhos.

"Eu tenho episódios de ansiedade muito antes da viagem. Começa no momento em que se fala em viajar", afirma a jornalista Danielle Cerati, 35.

Danielle conta que não sentia medo e já tinha feito várias viagens nacionais e internacionais de avião, até que, durante um voo de Porto Alegre a São Paulo, em 2017, o mau tempo causou tanta turbulência que ela nunca mais conseguiu viajar com tranquilidade.

"Parecia que o avião estava caindo, as pessoas começaram a rezar. Eu fiquei me segurando na cadeira. Quando cheguei em Guarulhos, estava tão atordoada que não conseguia andar direito, precisei ser amparada por um funcionário da companhia aérea", diz.

Depois dessa experiência, Danielle passou a evitar viagens, inclusive a trabalho. O medo de voar se tornou um tópico constante nas sessões de terapia.

No ano passado, ela conquistou uma grande vitória para quem tem medo de voar: conseguiu ir até a Alemanha visitar o irmão e conhecer seu primeiro sobrinho, que nasceu durante a pandemia.

"Ele já estava com dois anos e eu só o conhecia por fotos. Essa foi a motivação que me fez tomar coragem."

Para isso, Danielle tomou remédios prescritos por um médico para controlar a ansiedade durante a viagem. "Consegui viajar, mas não relaxar. Parece que os medicamentos só fizeram efeito mesmo depois que aterrissei. Aí foi difícil até para sair do aeroporto, ainda bem que eu estava acompanhada do meu marido", relata.

O psiquiatra Luiz Vicente Figueira de Mello, supervisor do Amban do IPq-HCFMUSP (Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP), explica que sentir medo é necessário para a sobrevivência da espécie. "O medo do ser humano resume-se no risco de morte", observa.

"A fobia específica de voar é situacional. É uma defesa exagerada contra o risco de morte. Desse modo, desencadeando sintomas de defesa, como evitar viajar ou passar mal durante o voo."

Para controlar esse medo, é preciso enfrentá-lo, orienta o psiquiatra. "Para isso, precisamos de tratamento ou orientação de um profissional. Atualmente, utilizamos a terapia cognitivo-comportamental (TCC), associada ou não a medicamentos, preferencialmente antidepressivos, que tendem a aumentar o limiar do medo e da ansiedade. Ansiolíticos podem ser utilizados pontualmente, ainda que com muito cuidado para não habituar o seu uso", diz.

Tammy Marchiori, neuropsicóloga, explica que a terapia cognitivo-comportamental trabalha com base em um tripé, que são as nossas emoções, a nossa cognição —nossos pensamentos— e os nossos comportamentos.

"A TCC tem base de evidência científica e é indicada para o tratamento de diversos transtornos e fobias, inclusive o medo de andar de avião", afirma.

"A primeira coisa que a gente vai fazer é uma avaliação para entender a natureza e a intensidade desse medo. Porque por mais que você pegue dez pessoas com medo de avião, cada uma vai ter um gatilho diferente", ressalta.

A TCC, esclarece a neuropsicóloga, vai atuar com a reestruturação cognitiva, ajudando a identificar e a modificar padrões de pensamentos negativos e distorcidos associados à fobia do avião.

"A pessoa que tem medo pensa que o avião vai cair ou que vai passar muito mal durante a viagem. Em geral, são pensamentos muito catastróficos. Esses pensamentos precisam ser reavaliados até serem substituídos por outros mais realistas", diz.

Durante o processo terapêutico, também é utilizada a técnica de exposição gradual. "A gente vai expondo essa pessoa, de forma gradual e controlada, a situações que envolvem voar. Pode começar, por exemplo, com a pessoa se imaginando dentro do avião. A gente pode complementar com visualização de vídeos de voos e, às vezes, até com um simulador de voo. Também é possível fazer um voo mais curto com o acompanhamento do terapeuta", conta.

O profissional também ensina estratégias para que o paciente saiba lidar sozinho com o medo e a ansiedade, como técnicas de respiração e de relaxamento muscular progressivo.

Para quem chega ao aeroporto ainda com muito medo, Maria Rita de Cássia Micheletto, chefe de cabine e gerente de comissários da GOL, informa que os passageiros podem pedir ajuda a funcionários da empresa aérea com a qual for viajar.

Maria Rita afirma que os profissionais são treinados e estão acostumados a lidar com essas situações.

"Já na recepção de boas-vindas, quando o cliente se apresenta e nos relata o medo, buscamos ouvi-lo, demonstrar segurança com esclarecimentos sobre o nosso trabalho e explicamos sobre a manutenção e segurança das aeronaves. Também é possível chamar um dos pilotos para conversar com o passageiro", diz.

Os comissários podem informar sobre as condições meteorológicas durante a viagem e áreas de possíveis turbulências. É possível visitar a cabine de comando em solo, de acordo com o que determinações da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), para que o passageiros se sintam mais seguro.

"Compreendemos perfeitamente o medo de voar. É uma sensação normal e compartilhada por muitos passageiros em todo o mundo. É importante destacar que os comissários estão totalmente cientes desse medo e são treinados para reconhecê-lo e agir de maneira cordial, educada e empática em todas as situações. A tripulação é treinada para fornecer informações sobre os procedimentos de voo, tranquilizar os passageiros e responder a quaisquer perguntas ou preocupações que possam surgir durante o voo. Eles estão lá para ajudar e garantir que todos os passageiros se sintam seguros e confortáveis durante a viagem", afirma Maria Rita.

Fonte: Folha de S.Paulo

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