sábado, 3 de junho de 2023

CACHORRO ATROPELADO

Carlos Heitor Cony
Já comentei, aqui mesmo e nas crônicas que escrevo na pág.2 da Folha, o histerismo da mídia nas críticas a Lula e à maioria de seus auxiliares mais próximos. Bem como ao seu partido. Não votei em Lula, jamais votaria no PT, que considero, em sua infra-estrutura ideológica e operacional, um arremedo do partido nazista com pólos trocados.

Compreendo que a sociedade esteja desiludida com Lula, ele fez e continua fazendo tudo para decepcionar aqueles que o julgavam salvador da pátria, impoluto, transparente, etc. É a negação de tudo isso --e, no meu entender, sempre foi assim, o povo é que não soube avaliá-lo.

Talvez mereça impeachment, fez muitas e más para ser impedido de governar o país. Daí a considerá-lo uma excrescência humana, o mais corrupto dos corruptos, não apenas é uma injustiça, mas uma besteira. Para não ir muito longe, o governo anterior foi bem pior do que o atual, canibalizou o Brasil a preço vil, encheu as burras dos intermediários e colocou a nossa economia a reboque do capital internacional, vale dizer, adiou por décadas e décadas a nossa autonomia econômica e política diante de outras nações.

No entanto, foi um governo louvado e lambido pelos entendidos, pela mídia em geral, pelos meios acadêmicos. Pela mesmíssima turma que agora se engalfinha num mata-esfola contra Lula, numa competição lamentável onde cada um pretende colocar na cabeça a coroa do mais indignado, do mais furioso contra os erros e descaminhos do atual governo.

O histerismo, o tom panfletário dos ataques a Lula e à sua turma revelam oportunismo e proposital esquecimento do passado mais recente. Chutar cachorro atropelado é um ato de covardia, não de lucidez. O governo é realmente um cachorro atropelado. Merece ser enterrado mas não chutado.

Fonte: Folha de S. Paulo - 22/11/2005

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