sexta-feira, 30 de junho de 2023

RECUPERAR SUA SENHA

Antonio Prata

Você tenta fazer o login, mas é óbvio que não tem ideia da senha

Você só queria ir ao cinema. Você entra no site pra comprar o ingresso. Tem que se cadastrar. Você preenche todas aquelas colunas do formulário. Nome completo, RG, CPF, endereço, e-mail, telefone, gênero, nome da mãe, número do sapato, colesterol (HDL e LDL), VO2 máximo, posição quanto ao coentro, "clique em todas as imagens que contêm pontes", "clique em todas as imagens que contêm escadas", "clique em todas as imagens que contêm hidrantes", "digite o código abaixo: WLAWFLACH328". Aí, ao dar enter, o site avisa que seu CPF já está registrado.

Você tenta fazer o login, mas é óbvio que não tem ideia da senha. Chuta algumas meio genéricas que você usa em sites pouco importantes, nada. Clica no "Esqueci minha senha". O site avisa que mandou um link para o Hotmail —mas você não abre o Hotmail desde 2006. Você entra no Hotmail e novamente, é claro, não se lembra da senha. Você clica em "Esqueci minha senha" e o Hotmail avisa que mandou um link para patrícia.gomes@munhoz&zylberadvogados.com.br.

Patrícia Gomes era sua namorada em 2004 e você costumava botar os dados dela em back-ups, contato de emergência na ponte-aérea, esse tipo de coisa. Vocês terminaram tretados depois de um Réveillon em Guaicá e nunca mais se falaram. Acontece que você quer mesmo ir ao cinema.

Você liga pra Patrícia e a chama para um café. No café, você assume a culpa pelo fim do namoro. Pede desculpas por ter sido agressivo numa partida de War e ter feito uma aliança por baixo do pano com o Maurão. Claro, você admite, era muito mais importante deixá-la à vontade na primeira viagem com a sua turma do que conquistar 24 territórios à sua escolha. Claro que você não a deveria ter atacado com seis contra um de Tchita para Vladivostok e a colocado para fora do jogo no primeiro dia de viagem. (Mesmo ela tendo te arrancado Dudinka via Omsk, cinco contra dois).

Ela aceita seu pedido de desculpas. Você explica a situação com a senha. Ela lamenta: saiu da Munhoz & Zylber advogados há 11 anos e abriu uma franquia de depilação definitiva da "Não mais pelos". Você sugere: e se ela falasse com o dr. Munhoz ou com a dra. Zylber, não seria possível recuperar o e-mail? Ela diz que está processando o babaca do Munhoz por assédio moral, pedindo R$ 50 mil.

Você realmente quer ir ao cinema. Vocês vão ao banco. A sua gerente diz que saques acima de R$ 5.000 têm que ser agendados previamente. Você saca R$ 4.999, vai até um caraoquê/bordel no subsolo de um estacionamento na Liberdade e compra um 38. Volta ao banco. Força a gerente a te dar R$ 50 mil e entrega pra Patrícia. A Patrícia liga pro babaca do Munhoz. Diz que retira o processo caso ele dê acesso ao antigo e-mail dela. O babaca do Munhoz aceita. Ela recupera o seu link do Hotmail. Você entra no Hotmail e encontra o link pra mudar a senha no site de ingressos. Você refaz a senha no site de ingressos.

Você consegue fazer o login. Você compra o ingresso, mas a gerente chamou a polícia, que quebrou seu sigilo digital e descobriu seu paradeiro. Você vai preso no meio do trailer da nova "A Pequena Sereia".

Seu colega de cela te vende um celular. Você descobre que o filme que queria tanto ver está passando no Star+. Você baixa o Star+ no celular. O Star+ te pede a senha. Você não faz a menor ideia de qual seja.

Fonte: Folha de S. Paulo
Quando eu pensar que aprendi a viver, terei aprendido a morrer. (Leonardo da Vinci)

LUGARES

GRINDELWALD - SUÍÇA
Grindelwald, comuna nos Alpes Berneses da Suíça, é muito usada como acesso à região de Jungfrau, com esqui no inverno e caminhadas no verão. É também frequentada como base para escalar a emblemática face norte do Monte Eiger. Gletscherschlucht, um desfiladeiro glacial nos arredores de Grindelwald, tem caminhos com sinalização, cachoeiras e paredes estriadas de pedra calcária. ― Google


MR. MILES


Apaixonado em Paris
(republicação)

Nosso apaixonado viajante esteve recentemente em Paris, uma cidade da qual ele lamenta gostar, dada a sua notória rivalidade com os franceses, que a redação supõe ser apenas uma questão atávica, resultante de séculos de guerras entre as duas nações. O fato, porém, é que sempre que fala da capital dos gauleses, mr. Miles não esconde seu incomensurável apreço. "In fact, my friends, ela seria perfeita se fosse habitada por vocês, brasileiros, ou por tantas outras populações afáveis e acolhedoras. Mas há que perdoá-los. Eles não têm culpa de ser tão antipáticos como são. Ou têm?"

O texto a seguir foi enviado para que publicássemos em sua coluna desta semana.

"Well, my friends, que saudades da velha e boa caneta! Acabo de perder uma carta que escrevi com alegria para vocês, detonada, my God, por um simples esbarrão em algum comando errado desses estranhos laptops, aos quais aderi porque tenho sido muito transigente. Vou tentar reproduzi-la, porque, I'm proud to say, minha cabeça não tem nenhum desses bugs.

Ela falava sobre a melhor prerrogativa de um viajante. A de flanar. Hoje, my friends, flanei em Paris. Entrei por ruas que nem sequer constam daqueles mapas que perdem as dobras com um sopro de vento. Vi, of course, os aguardados senhores com baguetes sob as axilas. Mas vi, as well... congolesas com as unhas pintadas de azul, coreanos vendendo produtos no atacado, judeus de quipá, homossexuais orgulhosos e cães altivos.

Em um café, notei, também, a presença de um jovem escritor revisando um calhamaço do que supus ser seu romance. Maybe the first one? O sol invadia o lugar como um verão feito à mão. Confesso-lhes, shame on me, que não pude resistir e, discretamente, dei uma olhada ao farto rascunho. Pude ver que se chamava Oscar e Julia. Os desenhos sob o título confirmavam que Oscar era o próprio rapaz ao meu lado.

And what about Julia? Aparentemente, uma princesa. Não tenho certeza se um dia saberei, ao certo, o que estava escrito naquelas páginas. Mas apaixonei-me por Julia, aquela Julia em bico de pena, como só se pode fazer em Paris. Ou em Praga. Ou em Veneza, but unfortunately not in London, que é feita de outro material. Aquelas são cidades de alma feminina que seduzem.

Mais uma vez, como em tantas outras viagens, o ato de flanar mudou o rumo de minha viagem. Believe me! Já não era eu que passava por Paris, mas Paris que passava por mim. Uma tarde, uma cidade e um sol que se incorporavam ao meu acervo de paixões ao lado de tantas amadas inesquecíveis.

Não tenho ideia do que Oscar tanto corrigia com sua caneta pequena e seu olhar atento. De minha parte, não havia nada que mudar. Estava tudo perfeito. Paris, o sol, as pessoas caminhando na tarde e, more than all, Julia. Ao contrário de Oscar que insistia em revisá-la, eu já a havia aceitado com todos os seus erros. Quem não os têm?

Pois vejam o que pode resultar da delicada atividade de caminhar sem destino, apenas atento às sensações. Flanar, therefore, pode ser perigoso para a saúde dos que não olham, não sonham e não viajam. Ou, perhaps, possa consertá-los. Keep dreaming, my friends.

Fonte: O Estado de S. Paulo

FRASES ILUSTRADAS

 

quinta-feira, 29 de junho de 2023

FALE COM SEU FILHO ENQUANTO ELE TE ESCUTA. CUIDE DOS SEUS PAIS ANTES QUE SEJA TARDE

Fabrício Carpinejar
É moda falar de pais narcisistas, mas pouco questionamos o papel dos filhos ingratos.

Dos filhos que gritam com os pais em público. Dos filhos que maltratam namorada do pai ou namorado da mãe, achando que eles não merecem uma segunda chance no amor.

Dos filhos que só aparecem para pedir empréstimo. Dos filhos que tiveram acesso a uma boa escola, mas não são capazes da mínima cordialidade dentro de casa.

Dos filhos que não dividem os méritos do seu sucesso, mas culpam os pais por qualquer fracasso. Dos filhos que consideram a aposentadoria como ociosidade e desdenham da disponibilidade dos mais velhos. Dos filhos que acumulam chamadas não atendidas no celular, juram ligar de volta e jamais retornam. Dos filhos que debocham da simplicidade do pai, do sotaque da mãe. Dos filhos que abandonam os pais no asilo, sem nenhuma visita. Portanto, ataque o problema quando ainda é pequeno. Quando ainda pode corrigir a dificuldade de comunicação.

Seja firme com o seu filho quando ele ainda está ouvindo. Não tente agradar. Não busque corrigir o excesso de trabalho com recompensas. Não bajule ou concorde sempre com o que ele anda fazendo. Limites previnem o estresse infantil.

Exponha o tamanho da sua resistência: “isso eu aguento”, “isso eu não aguento”. Transpareça suas emoções. Indique quais são os seus pontos de apoio, de onde a sua esperança tira força. Acorde cedo e reclame pouco. Elogie a disciplina oferecendo o exemplo. Esteja presente. Não terceirize o cuidado. Gerar filhos para passar a criação adiante é um contrassenso. Há drogas, violência e más companhias de sobra dispostas a adotar a sua criança.

Não adianta dar tudo para o filho, menos a presença. Bens materiais são péssimas babás.

Não perderá o emprego por meia hora de brincadeira, meia hora de correção de um tema, meia hora para comentar um desenho ou uma coreografia. Apareça em momentos cruciais da formação dele: na entrega do boletim, nas apresentações das datas comemorativas, nas formaturas, nos jogos escolares.

Enxergar o pai e a mãe na plateia ou na arquibancada, interagindo com os professores, resultará em amor-próprio. Sem testemunhas, a alegria vira egoísmo e tristeza. Marque compromissos familiares no seu calendário para não sofrer com conflito de agenda.

Renove os diálogos nas mais diferentes fases da vida. Não precisa usar as gírias, mas ofereça atenção genuína. O coração dispensa tradutores.

Se você vicia o seu filho em dinheiro, ele vai se expressar por cifras. Se você compensa a sua ausência com regalos, ele mandará representantes no lugar dele. Se você não cumpre promessas, ele será uma indústria de desculpas. Se você age com culpa, ele abusará de chantagens. Melhor o castigo num dia, do que a impunidade no resto dos dias. Salvará o futuro de vocês.

Fonte: https://www.portalraizes.com
Há quem me julgue perdido, porque ando a ouvir estrelas. Só quem ama tem ouvido para ouvi-las e entende-las... (Olavo Bilac)

LUGARES

DUBROVNIK - CROÁCIA
Dubrovnik é uma cidade no sul da Croácia na costa do Mar Adriático. É conhecida por sua Cidade Antiga, cercada por enormes muros de pedra erguidos no século 16. Seus prédios bem conservados abrangem desde a igreja barroca St. Blaise até o Palácio Sponza, da Renascença, e o gótico Palácio de Rector, agora um museu de história. Pavimentado com pedra calcária, o Stradun (ou Placa) é um passeio público repleto de lojas e restaurantes. ― Google


NÃO TROPECE NA LÍNGUA


CANHOTO, DIUTURNO, ENUNCIAR, EXPERTO, GOLS

> Canhestro, canhoto

Seu emprego na fábrica de artefatos manuais, na seção de miniaturas de palha, não durou uma semana, porque ele era canhestro.

Ninguém perde o emprego só por ser canhoto, não é mesmo? Canhoto é palavra usada para designar pessoa mais hábil com a mão esquerda; o contrário, para chamar quem utiliza mais a mão direita, é destro ou manidestro. Canhestro significa inábil, desajeitado, desengonçado. A propósito: quem utiliza as duas mãos com a mesma facilidade é ambidestro.

> Diuturno, diurno

Passou suas noites e dias à cabeceira dos doentes, mas esse trabalho diuturno jamais foi reconhecido pela direção do hospital.

Diuturno é o que tem longa duração; contínuo; que acontece ou se sustenta por muito tempo. Diurno é o que se faz ou acontece num dia (movimento diurno) ou que se faz ou acontece de dia, durante o dia (contrário de noturno).

> Enunciar, enunciação, anunciar

A aplicação da fórmula enunciada no decreto foi contestada de imediato.

Enunciar = exprimir, declarar, expor. Enunciação ou enunciado = expressão, declaração, proposição. Anunciar = dar a conhecer, noticiar, pôr anúncio de; indicar; predizer.

> Esperto, experto

Que menino interessante e esperto!

Esperto quer dizer arguto, vivo. Também há experto, com x: aquele que tem experiência ou conhecimento prático, o perito, o especialista, que muitas vezes é chamado entre nós pelo original inglês “expert”, por causa da pronúncia idêntica de experto e esperto.

> Gol, gols, golos, gois

Foram seus belíssimos gols que lhe justificaram a fama.

Entre as possibilidades de plural, a mais utilizada é aquela à moda inglesa: gols (o inglês mesmo é “goals”). Há pelo menos 20 anos as novas edições de dicionários admitem o plural à inglesa e toda a imprensa escreve gols. No Brasil praticamente não se usa nem golos (termo lusitano) nem gois (forma artificiosa).

Fonte: www.linguabrasil.com.br

FRASES ILUSTRADAS

 

quarta-feira, 28 de junho de 2023

ALEGRIA NA MÚSICA TRISTE

Paulo Pestana
Amigo estrangeiro, forjado na rebeldia do punk rock, nunca conseguiu entender a tradição brasileira de se reunir para tocar e cantar músicas tristes. Fica impressionado com a melancolia das letras dos sambas que ouve nas rodas, com a festa formada diante de temas depressivos e até com a acedia das melodias dos chorinhos.

Mal sabe ele que música triste é um lenimento para… a tristeza. É que, quando ouvimos música triste, o cérebro produz prolactina, hormônio que reduz a angústia. Ou seja, Amado Batista pode fazer bem à saúde, ainda que doa em ouvidos mais sensíveis.

Pesquisa feita com 772 alemães mostrou que canções tristonhas não apenas animam uma cabeça inchada, mas também ajudam a lidar melhor com as emoções a partir das sensações de nostalgia, paz, ternura e admiração provocadas.

Cotovelos sobre a mesa, à meia luz, a desilusão pode ser amainada pela voz de Jamelão: “Êta dor de cotovelo dos diabos, que saudade, que vontade de morrer”. Se não sair curado, não tem mais jeito.

Tudo parece ser uma questão de empatia. A desgraça do personagem da música serve de consolo para o sofredor da vida real, que encontra um parceiro, ainda que virtual, que o compreenda. Ainda mais se conseguir cantar junto de um cantor como Silvinho: “Essa noite, eu queria que o mundo acabasse, e para o inferno o Senhor me mandasse, para pegar todos os pecados meus. Esta noite eu queria morrer.”

Mas não é um sentimento que só alcança os bregas, até porque gente chique também sofre; a diferença é que muda a garrafa sobre a mesa – sai Drury’s, entra Johnny Walker Ultimate. O gelo e as lágrimas são idênticos. No alto falante, Maria Creuza debulha versos de Vinícius: “Eu sem você não tenho porque, porque sem você não sei nem chorar”.

Mesmo com música sem palavras, a sensação de conforto aparece. Um tema como a Valsa Triste, de Sibelius, que provoca altos e baixos a partir de frases musicais que alternam humores, pode ajudar na hora da fossa. A pesquisa alemã mostra que a conexão emocional entre ouvinte e música é criada mesmo quando não há condução por meio de palavras. Ou seja, o nó no peito é o mesmo.

Outra pesquisa, desta vez norte-americana, escolheu a música mais triste de todos os tempos. Ganhou Everybody Hurts, da banda R.E.M. “Todo mundo sofre”, canta Michael Stipe: “Quando o dia é longo e a noite é só sua, quando você tem certeza de que já se cansou dessa vida; bem, aguente firme”.

Em segundo lugar na tristeza ficou uma canção de Prince, mais conhecida na voz de Sinead O’Connor, Nothing Compares 2 You: “Tem sido tão solitário sem você aqui, como um pássaro sem canção, nada pode impedir a queda dessas lágrimas solitárias”.

Qual seria a música brasileira mais triste? Uma enquete recente colocou Vento no Litoral, da Legião Urbana, na frente. Mas isso só vale para quem nunca ouviu Meu Mundo é um Moinho, de Cartola, ou Pedaço de Mim, de Chico Buarque.

Publicado no Correio Braziliense em 9 de junho de 2023
Pare o mundo que eu quero descer... (Raul Seixas)

LUGARES

BUDAPESTE - HUNGRIA
Budapeste, a capital da Hungria, é dividida pelo rio Danúbio. Sua ponte Széchenyi Lánchíd, do século XIX, conecta o elevado distrito de Buda ao lado plano de Peste. 

UM PAÍS DE CHORAR

O Brasil sempre foi violento. Mas, agora, essa violência parece fermentar dentro de nós

A história tomou o noticiário: "Ex-aluno mata a tiros estudante e fere outro em escola no Paraná". Depois, o segundo estudante morreu. E, agora, o autor do ataque foi encontrado morto na prisão. É deprimente, não? Mas todo o Brasil está de chorar. Eis outras notícias do gênero, vindas de diferentes regiões do país, colhidas nos jornais e sites apenas nas últimas semanas.

Mulher assassinada em Alagoas gravou vídeo ao fugir do marido: "Se eu aparecer morta foi ele." Cliente dispara cinco vezes e mata segurança após ser impedido de entrar em bar em SP. Prisões de cinco estados têm relato de tortura de quebrar dedos. Homem atropela ciclista, é preso em blitz e depreda o próprio carro no RJ. Mulher envenena marido e filhos na Bahia e filma homem agonizando até a morte. Pai é confundido com estuprador e espancado no interior de SP. Filha e mais duas pessoas são condenadas por matar e carbonizar família.

Empresário é estrangulado e morto em encontro marcado por aplicativo. Homem é preso após espancar o próprio pai, de 77 anos, em Copacabana. Policial militar atira para o alto depois de ser agredido a pedradas na Liberdade. Escrivã encontrada morta aparece em vídeo sendo xingada dentro da delegacia. Programa do Ratinho tem dia de caos e mãe e filha partem para a pancadaria no estúdio. Motociclistas incendeiam as próprias motos diante da polícia em SP.

Pai atira no filho por roteador de internet em Uberaba. Ginecologista é condenado a 279 anos por estupro de 27 mulheres em Goiás. Homem ateia fogo em garota de programa na avenida Brasil. Jovem é arrastada pelo cabelo por BMW e perde parte do couro cabeludo. Ex-atleta agride entregador com coleira de cachorro. Homem negro é carregado com pés e mãos amarrados por PMs após prisão.

O que está acontecendo conosco? O Brasil sempre foi violento. Mas, agora, essa violência parece fermentar dentro de cada um de nós.

Fonte: Folha de S. Paulo

FRASES ILUSTRADAS

terça-feira, 27 de junho de 2023

QUEM VOCÊ CHAMA DE HERÓI?


Ler não é simplesmente decodificar palavras, mas também interpretá-las. Aquele que consegue ler a sua realidade dificilmente acredita em mentiras. Aprender a ler transforma o ser humano, o letramento é a melhor arma contra a desinformação. “E agora, quem irá nos defender?” Qual herói devemos chamar? No meio a tantos vilões do Whatsapp e do Telegram quem alfabetiza e cuida do letramento das novas gerações têm um papel fundamental na construção de um país melhor.

HERÓIS SEM CAPA

Talvez os heróis mais importantes do mundo não sejam os da Marvel ou DC, mas sim, aqueles “tios” e “tias” que ante a controvérsia das realidades cotidianas estão presentes na vidas das crianças quando estão na escola; a juventude fica mais tempo nas instituições de ensino do que junto de seus pais e mães se considerar as horas do dia.

Essas pessoas são Marias, Paulos e Josés, tão comuns, sem nenhum uniforme colorido, capa ou cueca por cima da roupa Collant.

RUMO À ALFABETIZAÇÃO

Em 1943, quando a Universidade de Pernambuco oferecia somente o curso de Direito na área de Humanas, Paulo Freire se matriculou. Conheceu sua esposa durante esse período, a professora do primário Elza Maia Costa Oliveira e no ano de 1944 juntaram as escovas de dente, não só elas mas suas mentes também.

Em 1946 tornou-se o Diretor do Departamento de Educação, Cultura e Serviço Social do Estado de Pernambuco, foi quando percebeu a necessidade de executar um trabalho voltado à alfabetização, criou os círculos de cultura em 1960.

A REVOLUÇÃO DOS CÍRCULOS DE CULTURA

O diálogo é a ferramenta essencial para a construção do círculo de cultura. Nele os problemas sociais são pautados por grupos de trabalhadores mediados por um professor.

Através dele são escolhidas as palavras-chaves que serão destrinchadas, para que se estude os fonemas, as sílabas, os plurais e assim começar o processo de alfabetização dos trabalhadores.

A figura do professor é de mediador, que constrói junto o conhecimento e não um instrutor de conteúdos, como um detentor da verdade, os membros de uma educação chamada por Freire de bancária, pois ela deposita o conteúdo nas mentes dos alunos sem contextualização, mera memorização.

Após desenvolver seu método, que consiste na utilização de palavras-chaves previamente escolhidas pelos círculos de cultura na alfabetização dos alunos, mas em 1964 a ditadura militar se instaurou no país e tudo mudou, os círculos de cultura viraram sinônimo de célula-terrorista.

Freire incomodava uma parcela considerável da elite brasileira que sempre foi preconceituosa, racista, provinciana e não queria o investimento público em autonomia do cidadão e/ou mobilidade social. Afinal, trabalhador sem estudo, sem qualificação, é mão-de-obra barata.

A FAMA INTERNACIONAL QUE HOJE INCOMODA

Em 1961, quando o Método começou a caminhar, mais de 200 cortadores de cana foram alfabetizados em tempo recorde, algo nunca visto na história desse país. Esse sucesso fez com que ele e sua equipe se destacassem e o colocassem à frente do Ministério da Educação.

Após o golpe militar de 1964 foi acusado de comunista, de implantar a teoria Marxista para seus alunos, foi perseguido assim como sua equipe e todos foram presos. Paulo Freire ficou 70 dias encarcerado.

As únicas opções que um regime autoritário conhece são: a eliminação da concorrência (literalmente), usar o pânico moral para manipular a opinião pública e o uso da força policial para repreender movimentos sociais, e assim foi feito.

O EXÍLIO

Quando teve chance, após 70 dias preso e torturado, Paulo Freire se exilou primeiramente na Bolívia e passou por Chile, Estados Unidos, Suíça, Guiné-Bissau, Porto- Príncipe, Cabo Verde, Austrália, Itália, Nicarágua, Ilhas Fiji, Índia e Tanzânia, andou muito, contribuiu muito e conheceu muita sala de aula.

Enquanto isso, aqui no Brasil, o regime militar criou o MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização) em resposta ao método freireano de alfabetização. Anos depois, no final da década de 70, já era visto na ponta do lápis o fracasso da ditadura.

O FRACASSO ESPERADO

Segundo estudo disponibilizado no website www.fgv.com.br da FGV (Fundação Getúlio Vargas) a respeito do MOBRAL, ”…a ineficiência do Mobral foi comprovada através dos resultados do Censo de 1980, que revelaram o aumento de 540 mil pessoas no número absoluto de analfabetos de 15 anos e mais no decênio 1970-1980.”

O imenso número de analfabetos funcionais (assinam o nome, sem letramento) foi o produto de uma política pública que começou a atender a interesses externos e não a real alfabetização dos brasileiros.

POR UM POVO LETRADO!

Freire morreu em 1997 mas o seu legado é cultuado mundo afora menos no Brasil, por que será? Supostamente a elite brasileira continua cultuando suas ideias retrógradas mas que ainda dão muito dinheiro, diria Jessé de Souza em seu livro “ A elite do atraso”.

Enquanto houver opressão, os seus livros farão de Freire presente em cada sala de aula, em cada suspiro de esperança como o chamado do herói, um cavaleiro da luz combatendo vilões num mundo de trevas e alienações. Precisamos ser fortes, precisamos continuar a luta, por nossos heróis.

https://www.revistaecosdapaz.com

Nunca deixo de ter em mente que o simples fato de existir já é divertido. (Katherine Hepburn)

LUGARES

FULDA - ALEMANHA
Localizada cerca de 100 km ao norte de Frankfurt, no estado de Hessen, Fulda foi o centro de propagação do catolicismo na Alemanha. A fundação de um mosteiro pelo beneditino Sturmius, em 744, a pedido de Bonifácio (o evangelizador dos germanos), é considerada a data de fundação da cidade.

ROMANCE FORENSE

Charge de Gerson Kauer
O abaixo assinado
Por Leo Iolovitch, advogado (OAB-RS nº 6.667)

O doutor Apolônio era o típico advogado de bairro, também chamado “porta de cadeia”, com clientela humilde e tratando os dramas humanos com sua experiência de vida e a malandragem que acumulou ao longo dela.

Numa tarde, ele irrompeu indignado na delegacia, acompanhado de um cliente, para protestar que a boate dele havia sido fechada. Perorava dizendo que fora uma injustiça.

O delegado, que conhecia bastante o advogado e também a tal espelunca, mostrou um abaixo assinado dos vizinhos, que pedia que fechassem o local diante do barulho e perturbação da ordem.

O doutor Apolônio olhou o papel, mostrou ao cliente e teatralizando atirou na mesa do policial, dizendo que não poderia ser verdade, reiterando o pedido de reabertura do inferninho.

O delegado assumindo uma postura de neutralidade disse a eles:

- Aqui há 25 assinaturas pedindo para fechar o local; se for verdade o que o senhor diz, então me tragam uma lista com o dobro de assinaturas, que eu libero e mando abrir.

Para surpresa da autoridade, o advogado respondeu:

- Pode deixar, vou trazer.

No outro dia chegou à delegacia uma lista com 51 assinaturas, dizendo que nada tinham em desabono em relação a tal espelunca, que não os perturbava.

O delegado mandou o comissário conferir se as assinaturas eram verdadeiras e de vizinhos. O agente voltou e, para surpresa geral, confirmou que tudo era verídico.

Então o doutor Apolônio foi chamado. O delegado disse a ele:

- Eu prometi reabrir com um abaixo assinado maior, recebi esse aí que achei que era frio, mandei ver e é quente, mas só vou liberar o local se tu me explicares o que está acontecendo...

O velho advogado, sorrindo, disse à autoridade policial:

- Vou contar para o senhor que é meu amigo. O dono da boate é um antigo cliente, que vive me devendo e eu estava precisando de dinheiro... Então eu fiz a primeira lista... aquela era a fria”.

Fonte: www.espacovital.com.br

FRASES ILUSTRADAS

segunda-feira, 26 de junho de 2023

PAI É PAI, NÃO AJUDANTE DA MÃE

Içami Tiba

Paternidade é uma função própria do pai, com direitos e obrigações familiares importantes. Pai não é coadjuvante da mãe, é seu complementar. A mãe costuma pedir ajuda ao pai: ajude aqui, por favor, fique um pouco com as crianças! Ele acha que está apenas ajudando a mãe e não se sente fazendo a sua parte.

Muitos pais nada fazem enquanto suas mulheres não pedem. Para os filhos não interessa se é a mãe que está muito ativa ou se o pai é muito passivo. O que eles precisam é de pai e de mãe.

Neste ponto, alguns pais reclamam que suas mulheres os tratam como se fossem filhos. Paternidade é a atitude de estar pronto a atender seus filhos, sem esperar que a mãe peça. Um pai acomodado, além de não ser um bom exemplo na família, estimula o filho a explorar a mãe.

Numa família assim pode se estabelecer uma confusão entre pai acomodado/pai bonzinho e mãe ativa/mãe rabugenta – quando na realidade o pai é negligente e a mãe ativa é obrigada a cobrar as obrigações de todos.

Fica muito clara essa situação quando uma mãe reclama que ela é a “pãe” da família. Ela tenta preencher também as funções de pai, o que é quase impossível. Há muitos homens, no entanto, que já assumem bem mais seu papel. Muito longe de querer substituir a mãe, eles querem tomar parte na educação do filho.

Fonte: https://www.portalraizes.com

Um ser que pára de pensar está ameaçado de perder todas suas faculdades e qualidades especificamente humanas. (Konrad Lorenz)

LUGARES

PROVINS - FRANÇA
Provins é uma comuna francesa no departamento de Sena e Marne, na região da Ilha de França. É uma subprefeitura. Provins, desde 13 de Dezembro de 2001, está classificada como património mundial pela UNESCO. Wikipédia

MEU FILHO GRANDE

Fabrício Carpinejar
Fabrício Carpinejar

Só pode saber que está morrendo quem tem um filho.

O filho é a régua da existência. Ele mede o meu fim. Mede o tamanho de minhas realizações. Mede o meu salário. Mede a minha folga. Mede a minha dispersão. Mede a minha loucura e a minha sanidade. Mede a minha vontade de acordar. Mede a minha felicidade. Mede a minha paciência com imprevistos.

Podemos até nos enganar sozinhos, só que não tem como disfarçar a fundura do cotidiano diante dos filhos.

O filho é a nossa largura, a nossa dimensão, é quando o mundo nos abraça e também nos esmaga.

O desemprego dói mais sendo pai. Um desaforo dói mais sendo pai. A risada é mais estridente sendo pai. Um elogio é mais desconcertante sendo pai.

Eu me acostumei a me encarar no espelho e desprezo as rugas, os pés-de-galinha, as olheiras. Não acompanho a minha idade - é como se mantivesse a vitalidade de um jovem por dentro do raciocínio.

O filho me devolve o meu tempo, o tempo findo e vindo da aparência.

Ele quebra as superfícies espelhadas e a fixação dos hábitos.

Não há mais como mentir a minha idade quando observo que ele me ultrapassou na altura, que usa calça 42, que o tênis abandonou o 37, que os meses sãos anos para o adolescente, que não compreende as minas gírias, que as minhas piadas não têm graça, que ele já é adulto e adquiriu uma melancolia no olhar, própria de quem já se frustrou alguma vez comigo.

Pelo filho, descubro que envelheço. Mas, por ele, não quero morrer.

Fonte: Facebook

FRASES ILUSTRADAS

domingo, 25 de junho de 2023

POR QUE FALAMOS 'DISCO VOADOR' E DIZEMOS QUE MARCIANOS SÃO VERDES?

Marcelo Duarte

Em homenagem ao Dia Mundial dos Óvnis, conheça a origem de expressões ligadas aos extraterrestres

No dia 24 de junho é comemorado o Dia Mundial dos Discos Voadores. A escolha da data faz uma referência a um episódio que aconteceu em 24 de junho de 1947.

Quando sobrevoava os picos dos montes Rainer e Adams, no estado de Washington, nos Estados Unidos, o piloto americano Kenneth Arnold disse ter avistado nove objetos brilhantes parecidos com discos circulantes. Foi a primeira notícia de avistamento nos Estados Unidos e marcou a fase moderna da ufologia no mundo.

Especialista em voos sobre montanhas, Arnold estava ajudando no resgate de um avião militar acidentado. Ele descreveu a um jornalista que os objetos voavam em formação e fizeram um movimento semelhante ao de "um pires deslizando sobre a água".

Se ele chamou de "pires", por que hoje falamos em "disco" voador?

No Brasil, o termo disco voador é uma tradução adaptada do inglês "flying saucer" (pires voador), utilizado pela primeira vez pelo jornal "Y East Oregonian", na edição de 25 de junho de 1947.

Nos anos 1950, a Força Aérea americana recebeu outros comunicados sobre objetos voadores. Como nem todos tinham o mesmo formato, acabou-se chegando à sigla UFO (Unidentified Flying Object), traduzido aqui como Óvni (objeto voador não-identificado).

Essa denominação pode ser usada para qualquer objeto visto no céu e que não seja identificado. Esses objetos, no entanto, são normalmente associados a naves extraterrestres.

Por falar em extraterrestres, por que se diz que os marcianos são verdes se Marte é conhecido como planeta vermelho?

Por causa de sua cor vermelho-sangue, o planeta recebeu o nome de Marte, o deus romano da guerra. Mas aí entra na história o escritor americano Edgar Rice Burroughs (1875-1950), que ficou conhecido pela criação do personagem Tarzan.

Antes de Tarzan, Burroughs deu vida a John Carter, herói da Guerra Civil americana, que foi abduzido por marcianos. "A Princess of Mars" (Uma Princesa de Marte) foi lançado em 1912 e deu início a uma série de contos ambientados naquele planeta.

A série "A Princess of Mars" teve 11 títulos no total. Burroughs descreveu pela primeira vez, fruto de sua imaginação, os marcianos como homens verdes.

Naquela época, os cientistas acreditavam que havia vida em Marte, bem como vegetações e grandes regiões de plantio. A série fez tanto sucesso que os marcianos verdes foram eternizados.

O que é contato de primeiro, segundo e terceiro grau?

Convencionou-se chamar contato de primeiro grau a "simples" observação de um ÓVNI; de segundo grau, quando a observação inclui também seres extraterrestres; e de terceiro grau se o narrador diz ter entrado em contato direto com tais criaturas.

Fonte: Folha de S.Paulo

LINHAS CRUZADAS

Fernando Albrecht
Nos tempos do telefone fixo de disco, o serviço era uma droga, na maior parte do tempo. Conversas cruzadas eram comuns. Você ouvia sem querer ou sem-querer-querendo até casais trocando juras de amor e promessas dessa ou daquela posição na cama. Não necessariamente nesta ordem.

Em empresas, às vezes o sistema PABX ficava sobrecarregado. Então, durava uma eternidade até conseguir linha. O mais exasperante depois dessa demora toda era o número discado dar sinal de ocupado.

Quando eu era bancário, uma das minhas funções era ligar para quem não pagou seu papagaio. Tinha suas manhas, e, recém-chegado a Porto Alegre, tive como instrutor um sujeito fantástico chamado Dalmir.

O cara era um pândego. Quanto não tinha alguém perto para aprontar, aprontava ele mesmo. Era especialista em imitar políticos ou colegas de trabalho.

No treinamento, eu ficava ouvindo a conversa com a orelha perto da orelha dele. E aí veio uma linha cruzada daquelas, conversa de namorados.

– Tu me amas?

– De paixão, benhê.

– Tô louquinho pra te ver. Posso ir aí?

– Tá… mas cuidado. Minha mãe marca de cima. Tem que ser no maior respeito.

Foi aí que o Dalmir entrou na conversa imitando perfeitamente a voz do namorado.

– Mas me espera sem calcinha, tá? Nuinha, só aquele vestidinho por cima…

E ficou quieto. Dali em diante houve um silêncio estupefato do casal.

– Podemos ir para a cozinha, quero passar a mão nessas pernas.

Os dois falaram ao mesmo tempo.

– O quê? Mas que é isso meu bem?

– Mas eu não falei nada, não sei como alguém entrou na conversa.

O cara deve estar dando explicação até hoje.

Fonte: https://fernandoalbrecht.blog.br
Um homem é realmente velho quando só pensa nisso. (Millôr Fernandes)

LUGARES

NÁPOLES - ITÁLIA
Nápoles é uma comuna do sul de Itália, da região da Campânia, província de Nápoles, com cerca de 1 000 000 habitantes e com cerca de 4 400 000 habitantes na região metropolitana. Nápoles é a terceira cidade mais populosa da Itália após Roma e Milão e tem a segunda ou terceira maior região metropolitana do país. Wikipédia

VENHA LOGO

Ruy Castro
Um conselho: se estiver a fim de vir ao Rio, venha logo. Não que estejamos em risco de perder o sol, o mar, a luz do inverno, o contorno das montanhas e outras atrações de autoria da natureza. Mas, com Marcelo Crivella como prefeito, tudo mais corre o risco de desaparecer. Ele não gosta da cidade.

Para começar, não conhece o Rio. Pode saber tudo de Tebes, Jericó ou Jerusalém, pelos anos que levou decorando o Velho Testamento, mas não sabe nada de ruas como a da Quitanda, o Ponto de Cem Réis ou a ladeira do Quebra-Bunda. Tem também mais intimidade com a África, onde foi, segundo diz, missionário, do que com a história da Pequena África, nos arredores da antiga praça Onze, onde se gestou o samba. Como não conhece nosso patrimônio histórico e cultural, Crivella o despreza ou trabalha para derrubá-lo. O Carnaval, por exemplo, seria mais tolerável se tocassem "Mamãe Eu Quero" em ritmo de gospel.

Em sua campanha à prefeitura, ele pregou que vinha para "cuidar das pessoas" —uma cotovelada na administração anterior, que se especializou em obras. Bem, sob Crivella, o Rio está batendo recordes de moradores de rua, e não adianta botar a culpa no desemprego. O que ele está fazendo para criar empregos e gerar riqueza?

Mas o que Crivella está mais exigindo dos visitantes é que, ao passear pelas ruas do Rio, exibam seus dotes de contorcionistas —para driblar as bancas de camelôs ou não pisar em todo o tipo de muamba espalhada sobre as calçadas. Entregue aos ambulantes, a cidade está aberta ao contrabando, ao roubo de cargas e à pauperização do comércio organizado, aquele que paga impostos e mantém empregados.

Crivella parece não gostar do comércio organizado. Mas com uma exceção: tente botar uma banquinha de Bíblias na porta de seu templo para ver se o pastor vai gostar.

Fonte: Folha de S. Paulo - 18/08/2017

PEREZ PRADO

FRASES ILUSTRADAS

sábado, 24 de junho de 2023

MEU FILHO NÃO QUER LER. E AGORA, JOSÉ?

Giovana Madalosso

Quase ninguém está lendo, ou quase ninguém está lendo tanto quanto gostaria

Há poucos anos, escrevi um texto me gabando de ter transformado minha filha em leitora. Eu contava que, tal qual o personagem de Kafka, ela havia passado por uma metamorfose, tendo se transmutado em um inseto, no caso, uma traça, com a couraça abaulada de tanto consumir livros.

Na ocasião, ela tinha nove anos. Como pode se esperar de uma escritora (desculpe o clichê), eu amo ler. Adoro a possibilidade de viver uma história em completo silêncio, coisa que só a literatura oferece.

Meu companheiro é dos meus. Portanto, à noite, tudo o que se ouvia na nossa casa eram páginas sendo viradas e aparelhos digestivos trabalhando, já que, antes de dormir, a tela era não apenas desincentivada como proibida para menores.

Essa rotina, que um coach chamaria de estratégia, acabou funcionando. Nunca obriguei minha filha a ler, mas, não podendo usar telas, tudo o que lhe restava era desenhar, olhar as manchas da parede ou se entregar à leitura. Depois de esgotar seus lápis, foi pegando um gibi aqui, um livro ali, até o dia em que a vi acordar cercada de celulose.

Poderíamos ter vivido para sempre nesse paraíso se a humanidade não tivesse mordido a maçã de Zuckerberg. Ou melhor, se ele e seus colegas do Silício não tivessem envenenado a maçã, usando diversos subterfúgios para prender a nossa atenção ou mesmo nos viciar nos aplicativos, como o botão de like, estímulo de resultado tão potente (e danoso) que chega a aparecer em tomografias na região do cérebro que ativa a dopamina.

De uns anos para cá, eu, meu companheiro e minha filha deixamos de ser traças e passamos a ser baratas insatisfeitas inventando desculpas para pegar o smartphone. Depois do jantar, digo para eles que preciso resolver uma emergência do trabalho e dou uma olhada no Instagram. Meu companheiro faz o mesmo, entrando no Twitter. Ela, que ainda não usa redes sociais, diz que precisa pegar uma tarefa no WhatsApp e aproveita para ver mensagens.

Sejamos honestos, quase ninguém está lendo. Ou quase ninguém está lendo tanto quanto gostaria. E se nem nós conseguimos, como cobrar isso dos nossos filhos? Se eu tivesse resposta, não estaria escrevendo esta coluna, e sim um best-seller, afinal muita gente está passando pela mesma crise.

Tudo o que sei é que vale a pena praticar pequenas resistências. Nem sempre lemos à noite, mas tentamos ler todas as noites. Nem sempre lemos em viagens, mas levamos livros para todas as viagens.

Sempre chega uma hora em que, como no poema "E agora, José?"

a festa acabou,
a luz apagou,
o wifi oscilou,
a mãe desplugou,
e o José, ou melhor, a criança, acaba pegando um livro.

E que livro é esse? Aquele que dá prazer.

E isso vale para todas as idades. Não conseguiremos competir com vídeos de gatinhos fofos ou com algoritmos turbinados para reter a nossa atenção se ficarmos de nariz empinado dizendo que só isto ou aquilo é boa literatura. Precisamos criar leitores livres, leves e soltos. Ou não criaremos.

Como já andei dizendo por aí, se o seu filho gosta de ler horóscopo, ótimo. Quem começa com áries acaba indo para libra, para a astrologia, para a astronomia, para a filosofia, e tudo isso pode dar em Clarice Lispector. Ou nos vídeos da Madama Brona. Porque também é preciso aceitar que, desde sempre, alguns de nós se tornam leitores ávidos e outros não.

Minha filha não é aquela traça que, em certo momento, aparentou ser, mas já sabe o caminho, já sabe como chegar às lombadas. E saber o caminho já é algum caminho andado.

Fonte:Folha de S.Paulo
A essência dos Direitos Humanos é o direito a ter direitos. (Hannah Arendt)

LUGARES

ROMA - ITÁLIA
O Fórum Romano ou Foro Romano localizado no centro de Roma, é um fórum rectangular, circundado pelas ruínas de várias construções públicas de grande importância cultural. O principal centro comercial da Roma Imperial, este espaço era popularmente conhecido como Fórum Magno ou, simplesmente, Fórum. Wikipédia

AS ARMAS E O ABORTO

Carlos Heitor Cony
Tenho ouvido besteiras de diversos tamanhos e feitios não mais a respeito do referendo, mas de seu resultado. Relevem a pretensão: achando que as duas questões --a do "não" e a do "sim"-- eram idiotas, continuo me divertindo com as explicações que estão sendo dadas pelos adeptos de uma ou de outra escolha.

O referendo foi pessimamente colocado, na base do comércio de armas e munições, como se fossem elas o problema que nos apavora. O "não" está sendo encarado como uma resposta do povo ao governo, atribuindo-lhe inércia e corrupção. É possível que muitos tenham adotado este tipo de condenação, mas o resultado do referendo transcende ao protesto.

O problema real, que nos últimos tempos tornou-se o que mais preocupa a população, é a segurança que nos falta. Segurança que o Estado não dá, seja no plano federal, estadual ou municipal. Armas e munições são ferramentas, como o punhal, o facão de cozinha, a paulada com que o namorado daquela moça paulista matou os pais dela que estavam dormindo.

O povo disse "não" à insegurança geral que pode a qualquer momento acabar com a vida de qualquer um de nós, por diversas formas e meios. Com a venda ou com a proibição de armas, o problema não será resolvido nem atenuado: continuará o mesmo, quem sabe até piorado, as leis secas que impedem isso ou aquilo acabam promovendo maior uso da coisa proibida, seja a bebida ou a droga.

Suponhamos que a questão do aborto seja proposta num próximo referendo. A pergunta certa seria: você é contra ou a favor do aborto? Digamos que a pergunta fosse: você é contra ou a favor das curetas que estraçalham o feto no ventre da mãe? Qual seria a sua resposta? Muitos abortos são feitos por agulhas e outros métodos mais primitivos.

Fonte: Folha de S. Paulo - 01/11/2005

FRASES ILUSTRADAS

sexta-feira, 23 de junho de 2023

O QUE VOCÊ FAZ QUANDO ALGUÉM TE TRATA MAL? - EU ME TRATO BEM E VOU EMBORA

Fabíola Simões

Se você acredita que precisa se ferir para não ferir o outro; se contrariar para não contrariar o outro; se desvalorizar para manter o outro por perto; talvez você tenha sido tão machucado que entendeu tudo errado. E acredita que não é possível alguém te amar se você se posicionar, dizer que prefere de outra maneira, negar um favor. Mas deixa eu te contar: as pessoas não ficam porque você aceita tudo, releva tudo, fala tudo o que elas querem ouvir. As pessoas podem até se aproveitar dessa docilidade; mas geralmente ficam com quem se prioriza; valorizam quem se valoriza; e amam quem se ama.

Cecília era uma mulher intensa. Do tipo que, quando ficava triste, se desidratava. Quando ficava feliz, cintilava. Quando amava, transbordava. Quando sofria, se despedaçava. Por isso, tinha muito medo de se quebrar em pedacinhos tão miúdos que seriam difíceis de colar. Assim, preferia sofrer a conta gotas, remendando com cola instantânea os caquinhos diários a se estilhaçar de uma vez e para sempre.

Muitas vezes, para evitar discussões, a gente congela. Para fugir de brigas, a gente engole sapos. Para não entrar em embates, a gente releva. Para não desgastar o relacionamento, a gente se cala. Para não perder a amizade, a gente diz “sim” quando gostaria de dizer “não”. Para não causar stress, a gente finge que não liga. Para não contrariar o outro, a gente se contraria.

Se você acredita que precisa se ferir para não ferir o outro; se contrariar para não contrariar o outro; se desvalorizar para manter o outro por perto; talvez você tenha sido tão machucado que entendeu tudo errado. E acredita que não é possível alguém te amar se você se posicionar, dizer que prefere de outra maneira, negar um favor.

Mas deixa eu te contar: as pessoas não ficam porque você aceita tudo, releva tudo, fala tudo o que elas querem ouvir. As pessoas podem até se aproveitar dessa docilidade; mas geralmente ficam com quem se prioriza; valorizam quem se valoriza; e amam quem se ama.

Se você aceita a indiferença e a grosseria; se você permite o desrespeito; se você tolera brincadeiras de mau gosto; se você não se afasta de quem invade seu espaço e o trata mal; se você autoriza o desprezo e não faz nada a respeito – sinto lhe informar, mas você está comunicando ao mundo que não tem valor algum, e o Universo o tratará como tal.

Se só você vai atrás depois de um desentendimento, só você pede desculpas, só você quebra o gelo, talvez seja hora de domar a ansiedade e se afastar. Deixar o tempo agir e peneirar o que deve continuar. Se a pessoa não se importa em te perder, é hora de desocupar a mente e o coração.

A gente não devia se acostumar com machucadinhos que parecem bobos, inocentes e toleráveis, mas que rasgam a pele. Esses ferimentos diários parecem imperceptíveis, mas são como cacos de vidro na autoestima. Se os aturamos por muito tempo é como se, para manter o equilíbrio, não nos importássemos com nossa dignidade e desistíssemos de nós mesmos.

Cecília tinha tanto medo de se estilhaçar que acabava aturando feridinhas inocentes na autoestima. Ia se tornando mais resiliente a cada dia, e não percebia que fazia concessões diárias que não devia.

Cecília amava Léo. E não queria perder Léo. E, para não perder, tirava um pouquinho do amor que tinha por si mesma e dava a Léo. Assim, ia reservando cada vez menos porções de amor para si mesma e oferecendo porções cada vez mais generosas a Léo. Porém, o que ela não sabia é que quem se doa além da conta comunica ao outro que não tem valor. Como Léo valorizaria Cecília se nem ela mesma se valorizava?

Depois de algum tempo você aprende que quando uma pessoa o trata mal, você deve se tratar bem e ir embora. E você aprende que não deve permanecer onde há indiferença, grosseria, falta de respeito, falta de limites. Descobre que deve partir sem olhar para trás, e só reconsiderar se houver arrependimento genuíno e pedido sincero de perdão. E você entende que é preferível chorar pelo fim de um relacionamento a chorar pela perda do amor-próprio e da dignidade.

Não tenha medo de partir. É preferível ser lembrada como a pessoa que foi embora e nunca mais voltou do que ser lembrada como a pessoa que, mesmo sendo tratada como um capacho, não teve forças de fazer as malas e ir embora.

Fonte: https://www.asomadetodosafetos.com