sexta-feira, 21 de abril de 2023

HOMENS, FECHEM AS PERNAS

Mariliz Pereira Jorge

'Manspreading, man-sitting', homem espaçoso, folgado, mal-educado; chame como quiser

Recentemente, num voo de duas horas, travei um combate com o meu vizinho de poltrona. O sujeito abriu as asas como uma gaivota prestes a decolar e achou por bem repousá-las no encosto de braço —que deveria dividir a nossa existência—, invadindo o minifúndio. Como se não bastasse, o folgado repetiu o gesto com as pernas.

Encolhida no cantinho que me restou, primeiro, pedi licença para me acomodar. Cri cri cri. Dei aquela olhada de reprovação. Nada. A contragosto, encostei as minhas extremidades nas dele como sinal de invasão de privacidade. Nem se mexeu. O homem tem certeza de que pode ocupar espaços públicos à vontade para não estrangular suas partes íntimas e seu conforto.

E, às vezes, as mulheres têm que se fingir de loucas para serem compreendidas e respeitadas. Foi o que fiz. Comecei a me mexer feito uma cobra no cio e, assim que ele se afastou para entender a situação, ganhei espaço e tracei o limite. Passei duas horas travada como um freio de mão, garanti um torcicolo e a antipatia do macho oprimido.

As companhias aéreas deveriam adotar o mesmo tipo de campanha que a SPTrans começou a fazer em São Paulo para que os homens fechem as pernas e não incomodem o passageiro ao lado. Em geral, uma passageira. Um problema comum às mulheres que pegam o busão em Madri ou em Nova York, duas cidades que tomaram a mesma medida para promover um comportamento masculino menos tóxico no transporte público.

O leitor pode pensar: mais um modismo importado da gringa. Verdade que veio de fora, tem até nome de batismo: manspreading ou man-sitting. Chame como quiser, homem espaçoso, folgado, mal-educado. Mas, longe de ser uma intervenção desnecessária, é o mínimo que se espera de civilidade no transporte público. Mais uma medida de segurança para as mulheres que enfrentam todo tipo de violência em ônibus e trens. Ninguém está pedindo nada de mais, apenas que os homens fechem as pernas.

Fonte: Folha de S.Paulo

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