Ainda não li o livro de Carlos Didier sobre Orestes Barbosa mas já gostei. Em minha opinião pessoal, foi, com Noel Rosa, o melhor letrista de nossa música popular. Numa comparação mais ou menos grosseira com dois romancistas também cariocas, diria que Orestes foi o Machado de Assis e Noel o Lima Barreto.
Fico hoje no Orestes, em seus "delírios nervosos dos anúncios luminosos que são a vida a mentir". São infinitos os versos que poderiam ser considerados os mais bonitos de nossa literatura, a começar com aquele que Manuel Bandeira considerou o melhor de todos, "tu pisavas os astros distraída".
Lembrando alguns: "Para não ver nos espelhos meus olhos muito vermelhos de tanto tanto chorar". Ou este outro: "Vou me mudar soluçante do apartamento elegante que tem, do antigo fulgor, lindos biombos ornados de crisântemos dourados, cenários de nosso amor".
Entre minhas músicas preferidas de todos os tempos, lembro "Flor do asfalto", que ensinei a todas as mulheres que amei ou que tiveram a desgraça de me amar (poucas, mas bastantes): "Deixou-me a flor do asfalto abandonado" e que termina com versos que revelam a dor de corno mais profunda: "Meu telefone agora vive mudo e o dela sempre em comunicação".
Raramente, Orestes invadia o terreno de Noel e tinha momentos geniais, como o samba "Caixa Econômica" no qual destaco uma das melhores estrofes da poesia brasileira: "Meu avô morreu na luta e o meu pai, pobre coitado, fatigou-se na labuta, por isso nasci cansado".
Grande Orestes! Foi vizinho nosso, no Lins de Vasconcelos. Levava para meu pai, em primeira mão, os discos com suas letras que acabavam de ser lançados. Usava gravata borboleta. Tomavam juntos várias garrafas de "Cascatinha" e foi de seu copo que bebi o primeiro gole de cerveja.
Fonte: Folha de S. Paulo - 31/02/2006
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