sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

TERÁ CHEGADO O FUTURO?

Eduardo Fernandez Silva*

Sabe-se ainda que os europeus, até o advento do uso do petróleo e gás, aqueciam-se nos invernos queimando árvores e, onde existente, turfa

Os europeus, todos sabem, sofrem neste inverno em razão do corte no fornecimento do gás russo. Algumas consequências dessa situação precisam ser mais bem conhecidas pois revelam o futuro provável com a continuidade da degradação da biosfera (água, ar e solo), praticada em diferentes graus por todos nós. O conhecimento talvez ajude na necessária alteração de nossos hábitos e rumos em busca de um futuro melhor.

Os europeus, todos também sabem, são os povos mais ricos, escolarizados, saudáveis e democráticos do planeta; desfrutam de uma qualidade de vida almejada pelos demais povos! São também os que mais poluíram e os que mais se beneficiaram pela maneira como estão organizados os processos poluentes dominantes nos últimos séculos.

Sabe-se ainda que os europeus, até o advento do uso do petróleo e gás, aqueciam-se nos invernos queimando árvores e, onde existente, turfa, que é um material orgânico decorrente da decomposição de plantas e animais, à semelhança do petróleo; sua queima é altamente poluente, razão pela qual havia sido proibida em Dublin em 2018. Só que custa à uma família cerca de €500,00/ano aquecer-se queimando turfa, contra alguns milhares de euros usando fontes limpas. Assim, na Irlanda, a queima de turfa cresceu, no último ano, quase 200%!

A prática tradicional de cortar a turfa na primavera e queimá-la no inverno retornou, com prejuízos para a saúde geral. As pessoas estão vivendo uma crise financeira imediata, e a percebem como mais importante que a questão ambiental e planetária: que se danem nossos filhos e netos, queremos nos proteger da conta de energia do próximo mês! E la nave vá…. Há que lembrar que os pântanos, de onde a turfa é retirada, são importantes fontes de absorção de carbono e, pois, essenciais nesta era do antropoceno, na qual a satisfação das necessidades humanas não pode mais se dar às custas da biosfera!

Na Alemanha, outra prática tradicional retornou, agravada pelo fato de hoje ser ilegal. Na terra de Goethe houve um crescimento substancial de roubo de madeira em florestas, para queimá-la, a ponto de as autoridades solicitarem a caminhantes por trilhas florestais que comuniquem atitudes suspeitas.

Essas situações anunciam o futuro porque, embora se trate de uma população com elevado nível educacional e de renda, o imediatismo compromete o longo prazo. Talvez nunca tenha havido, entre humanos, um conflito tão intenso entre os objetivos imediatos e a necessidade perene. Como enfrentar esse desafio, que provavelmente se manifestará de formas ainda mais desastrosas entre a maioria da população do planeta, pobre, com baixa escolaridade e parcas tradições democráticas?

Nem todos estão tristes com esse retrocesso. Como a queima de turfa ou de madeira resulta em fuligem na atmosfera, nos pulmões e, inclusive, nas chaminés, o grêmio dos limpadores destas últimas está comemorando…

*Eduardo Fernandez Silva. Mestre em Economia. Ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados

Fonte: https://www.metropoles.com

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