Gustavo Krause
Mais do que prática lúdica, o futebol é uma metáfora da vida
Eduardo Galeano (1940-2015), no livro Futebol – Ao sol e à sombra, reproduz o diálogo de uma jornalista com a teóloga alemã Dorothee Solle: – Como a senhora explicaria a um menino o que é a felicidade; – Não explicaria – respondeu – daria uma bola para que jogasse.
Os terraplanistas que me perdoem, mas o futebol, o maior espetáculo da terra, corre atrás de uma esfera, a bola que encanta e emociona o mundo inteiro. Com mais de 200 países associados, a FIFA é a maior multinacional do globo e um negócio que emprega direta ou indiretamente mais de meio bilhão de trabalhadores.
O que explica esta gigantesca dimensão do futebol? Na origem, o incipiente processo de industrialização alicerçado nos valores da produtividade e da legalidade. Assim, o futebol penetrou na sociedade capitalista e a economia abraçou o futebol.
Outro fator relevante: regras limitadas (17), estáveis e universais estabeleceram o arcabouço institucional para o esporte que já nasceu global.
Mais dois fatores se somam: esporte de acesso democrático com margem de imprevisibilidade e surpresa suficiente para mobilizar massas e despertar fortes emoções. Mais do que prática lúdica, o futebol é uma metáfora da vida
O genial Nelson Rodrigues ensinou: “Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola. A mais sórdida pelada é de uma complexidade shakespeariana”.
Embora tenha nascido branco, eurocêntrico, elitista, o futebol tornou-se mestiço, global, popular, criou identidades e personagens para além dos jogadores, entre elas, o torcedor, o juiz, o treinador e o “cartola”.
Com efeito, os personagens têm um complexo papel a ser exercido e, no seu conjunto, existe um permanente esforço para utilizar a diversão e o encantamento do jogo como instrumento de propaganda, em especial, nos regimes autoritários: Itália (1938), Brasil (1970), Argentina (1978) Rússia (2018). No Qatar, o desrespeito aos direitos fundamentais da pessoa revela ao mundo a face cruel do poder ilimitado e, em contrapartida, o ativismo político em favor das democracias.
Quanto ao futebol jogado, ficam algumas lições: a força, a velocidade, o sistema de marcação, a obediência tática demostram, de um lado, o nivelamento dos padrões coletivos e, de outro, confirmam a necessidade dos talentos individuais que fazem a diferença.
O contágio do ambiente planetário parece dar razão a Bill Shankly (ex-técnico do Liverpool): “Algumas pessoas pensam que o futebol é tão importante quanto vida e a morte. Elas estão muito enganadas. Eu asseguro que ele é muito mais sério do que isso”.
Fonte: https://www.metropoles.com
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