Wal Reis
Só entendemos o tamanho do luto quando o sair da cama se transforma em uma luta diária contra a vontade de esconder a cabeça embaixo das cobertas e fingir que ainda não amanheceu. Porque, na verdade, em você, ainda é noite fechada.
A gente só admite o quanto era bom o “sempre” quando tem que engolir o “nunca mais”. Só constata a luminosidade daquela presença quando a ausência apaga todas as luzes definitivamente. Só dimensiona o tamanho do amor quando não sabe mais onde colocá-lo.
Engana-se quem acredita que a morte é o encerrar da vida de uma pessoa apenas. Ela vai além: amarela sorrisos e avermelha olhos; desata abraços e ata nós na garganta; rasga planos, esfria um lado da cama e do coração.
Morrer deixa rastros. Cadeiras vazias e armários cheios de roupas. Restos de xampu e de sonhos. Remédios que não curaram e documentos que se extraviaram para sempre de seu dono.
A morte cria um acervo triste, repleto de últimos: a última foto, a última mensagem, a última lista do supermercado e o último até breve.
E perdura para muito além do dia em que tira alguém de tantos alguéns: vamos nos deparando com pedacinhos daquela existência na tampa de vidro mal fechada, nas meias que ficaram no varal e na manta predileta que aguardava o próximo inverno, que não virá. E mesmo tempos depois, quando a gente acha que não vai achar mais nada, espetamos o dedo na agulha presa ao carretel, que ficou esquecida no fundo da gaveta. E aquela linha fina costura novas lembranças.
Mas, apesar de tanto luto, quando pessoas queridas partem, deixam muito mais que saudade. Deixam um livro escrito pela metade, mas com páginas em branco para seguirmos contando a aquela história, a partir do último capítulo. E com a responsabilidade de chegarmos a um final feliz.
Fonte: http://walreisemoutraspalavras.com.br
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