segunda-feira, 27 de junho de 2022

UMA LAMPARINA

Fabrício Carpinejar

Não tem como sufocar as raízes. Não tem como sonegar o nascimento. Não tem como apagar os pratos prediletos da infância. Não tem como esconder a emoção do sotaque. Não tem como não entoar as canções da própria terra, é onde se guarda a saudade. Não tem como abolir parte do dicionário das ruas. Não tem como conter os gestos, os abraços efusivos, as expressões de carinho. Não tem como padronizar ninguém achando que existe o mais certo e o menos certo.

O preconceito com o nordestino reside na crença de que ele usa mal a língua portuguesa, de que fala errado, além de alimentar o imaginário de que está destinado a ocupar postos inferiores no mercado de trabalho.

A língua é viva, passional, inventiva. Quem pensa assim nunca leu Guimarães Rosa ou Manoel de Barros, nunca se deliciou com Patativa do Assaré.

É um elitismo da segregação, de fomentar rótulos orais para proteger os seus privilégios.

Privilegiado é quem honra pai e mãe, privilegiado é quem preserva os conselhos dos avós, privilegiado é quem respeita os seus antecessores, privilegiado é quem tem orgulho de sua casa e dos afluentes do idioma.

Nosso coração parte de um paradeiro. Nossa intimidade nunca será estrangeira.

O interior do nosso Brasil é a nossa alma.

Juliette veio combater a xenofobia de frente, o analfabetismo cultural, o turismo das aparências. Trajando os símbolos atemporais da contestação que nunca serão fantasias: traz a valentia de uma cangaceira, de uma Maria Bonita. É uma lamparina na escuridão do bullying, de chapéu de couro, jabiraca e alpercatas.
De suas cordas vocais, ressoa o triângulo, o forró da alegria, o lengo-lengo, o quindim.

Não foi aceita e não mudou. Não foi entendida e não mudou. Não foi aplaudida e não mudou. Por mais que seja interrompida no meio do raciocínio, por mais que seja imitada a sua comunicação ou ridicularizado o seu temperamento, como se ela fosse menos civilizada pela sua origem, ela jamais cedeu para agradar, seguiu o fio da meada de onde a pararam.

Ela não quis ser diferente de ninguém, mas ser ela mesma.

Juliette rompeu com a bolha do preconceito. Ela é a Paraíba, é o Nordeste, não é mais unicamente uma pessoa.

Ao conversar com ela, você atravessa um estado inteiro, o DNA de uma vasta e rica sensibilidade.

Fonte: Facebook

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