A ÔMICRON ESTÁ BOMBANDO: ISSO É BOM OU RUIM?
Pedro Hallal
Mundo bateu recordes de casos diários e países relatam números comparáveis aos piores momentos na pandemia
Desde que foi descoberta, cerca de um mês atrás, a variante ômicron virou pauta imediatamente. Relatos preliminares sugeriam que a variante era muito mais transmissível dos que as versões anteriores do coronavírus, o que era uma péssima notícia. No entanto, os mesmos relatos preliminares sugeriam que a variante era bem menos agressiva do que as versões anteriores do vírus, o que era uma ótima notícia. Restava a dúvida: as vacinas existentes protegem ou não contra a nova variante?
O primeiro relato preliminar se confirmou muito rapidamente. A ômicron está bombando no mundo todo, por sua incrível capacidade de transmissão. O mundo bateu recordes de casos diários na semana que passou e praticamente todos os países relatam números comparáveis aos piores momentos na pandemia.
Aqui é necessário abrir parênteses. O Brasil é exceção. No Brasil, as estatísticas ainda não mostram recorde diário de casos. Mas isso não significa que a ômicron não esteja bombando no país. Isso é apenas reflexo do apagão de dados do Ministério da Saúde, que parece ter desistido de vez de proteger a população do vírus. Além disso, a ridícula baixa testagem brasileira esconde a realidade da pandemia, não só agora, mas desde o seu início.
Enfim, a ômicron está bombando, no mundo todo (visível para todos) e no Brasil (escondida pela falta de dados). Resta saber: isso é bom ou ruim?
Não existe uma resposta definitiva para essa pergunta, mas é necessário avaliar as diversas possibilidades. Comecemos com o lado ruim da ampla disseminação da ômicron.
1) O fato de uma variante ser menos agressiva não significa que ela é irrelevante para o serviço de saúde. Imagine que, com o vírus original, havia uma morte para cada 100 infectados. Imagine que, com a ômicron, haja uma morte para cada 400 infectados. Ora, se tivermos 100 mil infectados ao mesmo tempo com o vírus original, teremos 1.000 mortes. Se a nova variante transmite mais, e conseguir infectar 400 mil pessoas ao mesmo tempo, o número de mortes estimado também será de 1.000. Ou seja, se a menor agressividade for compensada por um maior contágio na mesma proporção, o número de óbitos pode seguir alto.
2) O fato de uma variante ser menos agressiva não significa que ela não trará consequências em longo prazo para os infectados. Embora haja boas notícias de que a ômicron afeta menos os pulmões, a verdade é que não sabemos de seus efeitos em longo prazo. Nunca podemos esquecer da ampla quantidade de brasileiros que convive até hoje com sintomas persistentes depois da infecção por Covid-19.
3) O fato de a ômicron estar bombando reflete que as vacinas não conseguiram barrar sua expansão, sugerindo que as vacinas têm sim eficácia reduzida para essa nova variante. Note que a eficácia reduzida é observada para infecções, mas não para hospitalizações e mortes. Em outras palavras: pessoas vacinadas têm risco muito menor de caso grave e morte, seja com a ômicron, seja com as versões anteriores do vírus.
4) Quanto mais a ômicron circular, maior a chance de mutações e surgimento de novas variantes. E já aprendemos o quanto essas novas variantes podem retardar o final da pandemia.
Mas não podemos fechar os olhos também para os potenciais cenários positivos.
1) O risco de casos graves com a ômicron, que já é mais baixo no geral, é muito mais baixo entre pessoas vacinadas. Num país como o Brasil em que a maior parte da população está vacinada, há boa chance de a ômicron não conseguir aumentar tanto as hospitalizações e óbitos.
2) Criar políticas públicas baseadas na "imunidade coletiva" era criminoso no início da pandemia e ainda é criminoso hoje. Expor pessoas ao vírus deliberadamente é um crime pelo qual nossos gestores estão sendo adequadamente investigados. No entanto, a "imunidade coletiva", que era inatingível com as versões anteriores do coronavírus talvez não seja inatingível com a ampla e rápida disseminação da ômicron.
Enfim, o cenário ainda traz muitas incertezas, especialmente num país em que os dados estão desaparecidos e, mais do que nunca, o governo federal se coloca ao lado do vírus e contra a população.
Nós, da ciência, seguiremos "olhando para cima" e tentando ajudar a nossa população, apesar do boicote e das perseguições daqueles que só "olham para seus umbigos".
Fonte: Folha de S. Paulo
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