Texto autoral de Karine Borges de Liz
Nunca é uma palavra que não se aplica pra muita coisa. Disso quase nunca duvidei.
São tantos anos observando tantas vidas. Gerações inteiras. Que posso me dar ao luxo de dizer, que o vai e vem da vida é das escolas a mais comprida, e a mais difícil de se aprender.
E nunca, nunca é uma palavra que não se aplica a um mundéu de coisas.
A primeira vez que me instalaram, na porta da frente de uma casa bonita de estância, o patrão me firmou com tanta força na madeira como que a se convencer de que por ali passaria só a sua nova vida. Que nunca mais olharia para as suas feridas.
Esqueceu ele que os fantasmas são fiéis aos seus assombrados, lembrando sempre o que falta ser consertado.
De família de muita briga, em casa que faltava pão, assim que pode ganhou o mundo, mas fez isso logrando o irmão.
Nunca mais vou olhar pra trás, disse certa vez com dedo em riste. Eu olhei de onde estava e lamentei a pouca sabedoria do triste.
E então os anos de prosperidade viraram danação, pois um dia todo esperto encontra um mestre mais ladrão.
Perdeu a estância num negócio mal feito, e eu da porta da frente fui parar num galpão de fazenda que ficava num lugar no mapa que eu nunca sonhava que existia.
E assim passei a chimarrear com a peonada bem cedinho. Ouvindo causos e histórias, guardando segredos falados baixinho, segurada numa porta que separa o vão principal do galpão, do quartinho das miudezas e dos utensílios.
Hoje vejo gente de toda parte, cada qual com sua sina. Vejo o inverno que entra e as suas geadas de arrepiar o pelo. Vejo o vicejar da primavera com o cantar dos pássaros e a sinfonia dos cincerros. Nunca é a mesma paisagem, mesmo sendo o mesmo lugar.
Por mim passam mãos de toda sorte e tipo. As calejadas e a de toque bonito; as firmes e as frouxas tipo sapato amarrado com má vontade; as cheias de raiva e as que derramam bondade. Tem aquelas que sinto a falta, pois nunca mais as vi.
Corrijo. Pra isso o nunca, não tem validade. O que os olhos não veem, o coração enxerga pela saudade.
Agradeço a Dona @reginac7361 pela foto que inspirou essa crônica.
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