Ruy Castro
Um livro propõe que, 61 anos depois, o Brasil volte a ter um centro político que inclua o povo
A exemplo do samba segundo Nelson Sargento, o Rio agoniza, mas não morre. Capital por 197 anos —do Vice-Reino, Reino Unido, Império e República—, trocaram-no por um capricho, levaram para longe o Congresso, o STF, o Itamaraty, os bancos, os parques industriais e, para acabar de esvaziá-lo, fundiram-no a um estado pobre e o reduziram a capital desse estado. Tiraram-lhe o que puderam. E, incrivelmente, o Rio sobreviveu.
Tiraram, mas não tiraram. O Rio continua a ser o reduto da máquina do Estado, do funcionalismo, das estatais, dos efetivos militares e dos grandes próprios federais —dos palácios e prédios históricos aos monumentos naturais e instituições científicas. Só reduto, porque tudo isso ficou subordinado a Brasília. Ainda é Distrito Federal —sem ser. O Rio nada ganha com isso, e o Brasil só tem a perder. Quando o Rio deixou de ser o centro político, foi o país que sofreu. Brasília é uma das capitais mais isoladas do povo em todo o mundo.
Um livro recém-lançado tem uma proposta: a instauração do Rio como segundo Distrito Federal. O quê? Duas capitais? Sim, vários países as têm —China, Índia, Coreia do Sul, Indonésia, Taiwan, Arábia Saudita, África do Sul, Rússia, Chile—, e elas se completam. Não se trata de despir Brasília para vestir o Rio, mas de corrigir a combinação de casaca e cueca com que o Brasil se traja. Brasília seria a sede administrativa. A outra seria a capital ao alcance do povo, a verdadeira cidade nacional.
O livro se chama "Rio, 2º Distrito Federal", do cientista político Christian Lynch e parceiros (302 págs., R$ 69, 90, somente físico). O que se lê acima é uma adaptação do texto de quarta capa que tive a honra de escrever.
Sim, sei bem como algumas pessoas reagem ao Rio —a corrupção, a violência etc. É no que dá ser o tambor da nação enquanto o resto da orquestra toca a mesma partitura, só que escondido e em surdina.
Fonte: Folha de S. Paulo
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