quarta-feira, 10 de março de 2021

O CARA DO CAMINHÃO

O CARA DO CAMINHÃO

Tem um causo acontecido nos anos 1990, quando começou a onda de trazer bluezeiros americanos. Ele estava hospedado no hotel Alfred Porto Alegre, na rua Senhor dos Passos, que tinha um bar maravilhoso chamado Tyffany’s, decoração baseada no Harry’s Bar de Veneza. Um luxo. Sua época de ouro foi a partir do final dos anos 1970.

Um guitarrista americano, homem de quase dois metros de altura, cujo nome me escapa, tinha uma história igual a tantas outras. Um caminhoneiro negro que tocava blues como ninguém nas estradas dos Estados Unidos, até que alguém o descobriu. Certa noite, estava eu no bar do Alfred quando ele entrou, sentou numa mesa e pediu suco de laranja com rum. O barman o olhou com certa desconfiança quando ele fez o pedido.

Outro freguês do bar sentou-se no piano e tentou, eu disse tentou, tocar um boogie woogie. Sabem como é, usar a mão esquerda não é para qualquer um. Alguns compassos depois, o bluezeiro se irritou, meio que tirou o cara a tapa do piano e, aí sim, ouvi maravilhado um BW à Luca Sestak.

Depois que terminou, voltou ao seu suco de laranja com rum. Bati discretas palmas. O barman, que obviamente era zero em boa música, estava limpando um copo com um pano branco. Inclinou o rosto.

– Quem é esse cara?

– Um caminhoneiro – respondi.

Ele terminou de polir o copo, colocou-o de volta na prateleira de vidro de costas para mim. Volteou a cabeça.

– Logo vi.

Fonte: http://fernandoalbrecht.blog.br

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