quarta-feira, 31 de março de 2021

DE MINISTROS E TELENOVELAS

DE MINISTROS E TELENOVELAS
José Horta Manzano

Não é à toa que telenovela faz tanto sucesso no Brasil. E não é de hoje. Quando não havia tevê, nossas mães e avós já se encantavam com as radionovelas. A razão é simples: brasileiro adora assistir a um espetáculo grátis. Se for dramático, melhor ainda. Se sair sopapo e palavrório, é um delírio. Se pingar sangue, então, é o nec plus ultra, o júbilo total.

Em outras terras, troca de ministros é operação que já chega ao distinto público como pacote pronto e embrulhado pra presente. Sai um, entra outro, cumprimentam-se na porta, e a vida segue macia. As tratativas e negociações que precedem a escolha fazem parte da cozinha interna e nunca são divulgadas. Entre nós, não funciona assim.

O povo aprecia um espetaculozinho. Começa já semanas antes, com ‘fritura’ pública do titular e boatos que correm. Será que cai? Será que não cai? Depois vêm os ‘convites’. Fulano foi convidado; vai aceitar? Ih, foi conversar com o presidente! Será que se entenderam? Não, parece que não deu certo. Dizem que a Ala X quer, mas a Ala Y rejeita. E assim segue, como se fosse espetáculo teatral, com a população sentada na fileira da frente. Entre uma pipoca e outra, cada um dá seu palpite.

Quando, finalmente, a coisa decanta e o novo ministro é nomeado, parece último capítulo de novela. Comentários correm soltos pelos elevadores, na rua, no cabeleireiro, no supermercado, na padaria. Passado o desenlace, todos murcham e já se preparam para a próxima atração.

É um procedimento peculiar, esse modo brasileiro de troca ministerial. Mal comparando, é como se um sujeito fosse trocar de carro e os vizinhos resolvessem se intrometer. Cada um se permitiria dar palpite (não solicitado) sobre marca, modelo e cor, tudo sob o olhar atento da rua inteira (ou do condomínio inteiro), uma multidão dividida em alas, cada uma torcendo por seu modelo ou sua cor. É surreal.

No fundo, a escolha de ministros de Estado é ato privativo do presidente da República, visto que são assessores de sua confiança – é o que reza a Constituição. Em princípio, pois, o chefe do Executivo não deve satisfações a ninguém nesse assunto. Se o povo está em desacordo com a política deste ou daquele ministério, o melhor caminho não é reclamar do ministro. Ele foi nomeado para executar a política ditada pelo chefe. No fundo, o cômico Pazuello tinha, até certo ponto, razão: “Um manda, outro obedece”.

O general ficou marcado para o resto da vida pela ingenuidade de ter pronunciado a frase, mas ela não deixa de refletir a realidade. O que se reprova não é tanto que ele a tenha dito, mas que tenha aceitado o posto, já sabedor de que teria de se curvar a um chefe iracundo. A doutora que, outro dia, recusou o posto mostrou-se também ingênua de acreditar poder impor suas visões a um presidente obcecado por conceitos que, viessem de um terraplanista, não chocariam. A ex-futura titular da Saúde escapou na undécima hora, justo a tempo de evitar ter de carregar no currículo a pecha de ter sido ministra de Bolsonaro.

Esse rebuliço que se alevanta a cada troca de ministro não desenha imagem firme e forte do governo federal. Dirigente forte, bem assentado e de pés no chão dispensa teatralidade: troca seus assessores e pronto. Tratativas há, como é natural, mas não há por que deixá-las transpirar. Com a publicidade que foi dada à contratação da quase ministra Hajjar, quem saiu mal foi o próprio presidente. Ao fim e ao cabo, a imagem passada à nação é de que foi ela a dispensar Bolsonaro, e não o contrário. Outro que saiu mal na foto foi o sucessor do general demitido. Está passando recibo de ser ministro de segunda linha – “second choice”, como diriam os ingleses. Isso é péssimo.

Inteligência e sutileza não são mercadoria abundante no Planalto, disso sabemos todos. Será essa a razão de Bolsonaro não estar se dando conta de que, ao imprimir a uma simples troca ministerial ares de espetáculo teatral, está deixando claro que o governo é fraco, hesitante e dependente da opinião alheia. Não fica bem sobretudo para um presidente que, mais de uma vez, já chegou a reclamar: “Quem manda aqui sou eu, pô!”.

Fonte: brasildelonge.com
Para triunfar na luta pela vida, o homem deve ter ou uma grande inteligência ou um coração de pedra. (Máximo Gorki, escritor russo, 1868-1936)

LUGARES

MONT SAINT-MICHEL - FRANÇA
O Monte Saint-Michel é um ilhote rochoso na foz do Rio Couesnon, no departamento da Mancha, na França, onde foi construída uma abadia (abadia do Monte Saint-Michel) e santuário em homenagem ao arcanjo São Miguel. Seu antigo nome é "Monte Saint-Michel em perigo do mar" (Mons Sancti Michaeli in periculo mari). Este mosteiro, fortificado no século XIII, integra um conjunto com mais três cidades cujas fortificações e desenvolvimento são notáveis: Aigues-Mortes (1270-1276), ponto de reunião dos Cruzados rumo à Terra Santa, Carcassone, célebre por suas defesas, e Avinhão, sede alternativa da Cristandade (1309-1377). Estas cidades fortificadas, denominadas "bastides" marcavam a fronteira dos reinos ao final da Idade Média, servindo como elementos de defesa e dando ao povo novas oportunidades sociais. 

CANÇÕES DO EXÍLIO

Carlos Heitor Cony

"Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá" (Gonçalves Dias). "No Brasil tudo é possível, até o impossível" (Machado de Assis). "No Brasil coqueiro dá coco" (Ary Barroso). "Ah, que saudades que eu tenho da aurora da minha vida" (Casimiro de Abreu). "Antes te houvessem roto na batalha, que servires um povo de mortalha" (Castro Alves). "Quero ser pobre sem deixar Copacabana" (Antonio Maria). "O Rio amanheceu cantando, toda cidade amanheceu em flor" (Braguinha). "O chefe da polícia, pelo telefone mandou me avisar que na Carioca tem uma roleta para se jogar" (Donga). "Copacabana, princesinha do mar, pelas manhãs tu és a vida a cantar" (Tom Jobim).

"Paquetá é um céu profundo que começa neste mundo mas não sabe onde acabar" (Hermes Fontes). "Os inocentes do Leblon não viram o navio entrar. Trouxe bailarinas? Trouxe imigrantes" (Drummond de Andrade). "Vou-me embora, senhora, que me dão para levar? Saudades, penas e lágrimas eu levo para chorar" (Machado de Assis). "Para ver a minha santa padroeira eu vou à Penha de qualquer maneira" (Ary Barroso). Passei por ela na rua Bom Pastor e ela nem soube que eu passei tão perto nem suspeita que segui chorando (eu mesmo).

A Ilha do Governador, como diz a geografia, é cercada de mar por todos os lados. Não tem nenhum governador, mas é o único lugar do mundo que tem o Peitoral Loiola, porque a sua farmácia não se chama Loiola mas Boriloi, nome que nunca foi explicado. Fica no Cacuia, em frente ao cemitério. Ao contrário do mundo, o cemitério tomou o nome do bairro, e o bairro ficou com o nome do cemitério (eu mesmo). "Senhor, eu quero andar na rua do Catete" (Rubem Braga). Devido à violência e às balas perdidas, o carioca pode morrer antes de nascer (segundo os jornais).

Fonte: Folha de S. Paulo

FRASES ILUSTRADAS


terça-feira, 30 de março de 2021

REORDENAÇÃO DE PRIORIDADES

REORDENAÇÃO DE PRIORIDADES
Hélio Schwartsman

Temos diferentes lógicas, que se mostram mais ou menos justificáveis

Já escrevi mais de uma vez que é complicado falar em certo e errado quando definimos os critérios de prioridade para a vacinação contra a Covid-19. O que temos são diferentes lógicas que se mostram mais ou menos justificáveis.

O que a maioria dos países acaba fazendo é combinar critérios que priorizam a proteção aos mais vulneráveis, como idosos, com critérios que privilegiam categorias de alta exposição que desempenhem funções essenciais, caso dos profissionais de saúde.

Assim, em condições normais, eu aplaudiria a decisão do governador João Doria de incluir professores e policiais entre os grupos que devem receber a vacina mais cedo. Eles, afinal, estão expostos e exercem funções quintessenciais. Só que não estamos em "condições normais".

O momento epidêmico que vivemos, com grande parte dos hospitais à beira do colapso, cobra uma revisão temporária de prioridades. Se estamos cogitando fechar quase tudo para tentar evitar a superlotação, parece claro que a vacinação também deve buscar esse objetivo.

Trocando em miúdos, estamos numa fase em que faz mais sentido vacinar quem, por idade ou comorbidades, tem maior chance de vir a ocupar um leito hospitalar. Professores e policiais podem voltar para a lista de prioritários assim que o risco de colapso estiver afastado.

Como a vida não é simples, não posso deixar de lembrar que existem complicações na vacinação de pacientes com comorbidades. Se ninguém tem dificuldades para reconhecer um grande obeso, o mesmo não pode ser dito de diabéticos, hipertensos etc. A vacinação desses indivíduos tem de ser feita mediante apresentação de atestado médico, o que, no país do jeitinho e dos favores, pode ser um risco.

Se aparecerem muito mais diabéticos e hipertensos do que o esperado pelos estudos de prevalência, ou o brasileiro excele nas artes da falsificação ou a classe médica terá fracassado na prova de ética.

Fonte: Folha de S. Paulo
O conformismo é o carcereiro da liberdade e o inimigo do crescimento. (John Fitzgerald Kennedy)

LUGARES

CONSTANÇA - ALEMANHA
Constança (em alemão: Konstanz) é uma cidade universitária no sul da Alemanha e a maior cidade nos arredores do lago de Constança, no distrito de Konstanz, na região administrativa de Freiburg, estado de Baden-Württemberg. Nela encontram-se duas universidades, a Universidade de Konstanz e a Universidade de Ciências Aplicadas. Nesta cidade realizou-se, de 1414 a 1418, o Concílio de Constança, que resultou no fim do cisma papal. Konstanz tem 81 919 habitantes e uma área urbana de 54,11 km². A cidade fica no lago de Constança, que é o maior lago da Alemanha. (Wikipédia)

ROMANCE FORENSE

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Charge: Gerson Kauer
Incríveis histórias da Advocacia 

O empresário recém descasado costumava fixar os olhos na gerente da agência bancária onde era cliente.

Vai daí, vai daqui, em junho de 2011, ao sentar-se à mesa dela, o homem comentou sobre o inverno que atormentava Porto Alegre e sobre o clima ameno em New York e abriu o jogo:

- Gosto muito de Manhattan e estou ansioso por voltar lá e curtir, bem acompanhado, amenas caminhadas no Central Park, olhar vitrines na 5ª Avenida etc. Só ainda não me programei porque New York é uma cidade para ser curtida a dois. E como estou só...

A gerente sentiu a oferta, mas foi econômica no comentário:

- Eu também gostaria de ir, mas...

Vai daí, vai daqui, alguns dias depois o empresário comprou duas passagens de ida-e-volta. Ele foi logo, de novo, à agência bancária, exibindo - como imprescindível primeiro passo para a etapa seguinte - os tickets eletrônicos de viagem. Assegurou a ela que já fizera reserva de hotel, "bem ali na Broadway, na maravilhosa zona dos teatros".

A gerente conseguiu férias de oito dias e a viagem saiu no dia marcado. Na chegada ao hotel novaiorquino, o empresário sentiu um "frio na espinha" e fez cara de espanto. Deu-se conta de que havia "esquecido" todos os seus cartões de crédito em Porto Alegre.

Pedir o envio de novos cartões e enviá-los a New York demandaria uma semana - justo o período da viagem.

A gerente bancária foi solidária e resolveu o impasse:

- Que não seja por isso! Minha conta bancária é mais modesta que a tua, tenho apenas dois cartões, mas pago tudo aqui e na volta tu me reembolsas.

A hospedagem no Novotel foi maravilhosa, os passeios encantadores, as noitadas incluiram jazz no Blue Note e um show de música gospel no Harlem. Tudo pago com os dois cartões de crédito da gerente.

Durante o voo de retorno, o novel casal se desentendeu. Já em Porto Alegre, tocou exclusivamente a ela o pagamento de exatos 5.889 dólares de hospedagem, refeições, espetáculos etc. O empresário, decisivamente, não se coçou.

* * * * *

Era agosto do ano seguinte - em plena Semana do Advogado - a gerente procurou um ativo escritório, pedindo uma ação cível contra o empresário. O profissional da Advocacia indagou minúcias, viu as contas pagas pela mulher e vaticinou:

- A ação será de insucesso total. Afinal, o empresário entrou com as passagens. Tu entraste com o teu corpo, em todos os sentidos, e, na volta, com o pagamento das contas dos sete dias de intenso romance. Mas, consola-te: foi em Manhattan! E eu vou poder incluir esta tua história num livro que vou escrever quando me aposentar.

Título da futura obra: "Incríveis histórias da Advocacia". 

Fonte: www.espacovital.com.br

FRASES ILUSTRADAS


segunda-feira, 29 de março de 2021

A EPIDEMIA FUGIU DO CONTROLE

A EPIDEMIA FUGIU DO CONTROLE
Drauzio Varela

Brasileiros decretaram o fim do coronavírus em novembro sob a justificativa de que ninguém aguentava mais ficar em casa

Os brasileiros decretaram o fim da epidemia, em novembro do ano passado. Os bares lotaram, multidões nas praias, famílias reunidas no Natal e no Ano-Novo, festas clandestinas à luz da noite espalhadas pelas cidades, Carnaval.

A justificativa para esse comportamento estúpido era a de que ninguém aguentava mais ficar em casa.

Em janeiro, chegaram as férias. Os hotéis dos recantos turísticos voltaram a receber hóspedes, as ruas das metrópoles se encheram de gente aglomerada sem máscara e de ônibus e trens superlotados pelos que não tinham alternativa senão trabalhar.

Alheio a tudo, o presidente da República passeava de jet ski, cumprimentava admiradores e posava sem máscara para selfies, o Ministério da Saúde distribuía o kit Covid, deputados e senadores tentavam aprovar uma emenda à Constituição para livrá-los da prisão em flagrante e faltava coragem à maioria de governadores e prefeitos para decretar medidas rígidas de afastamento social.

Os médicos, os sanitaristas e os epidemiologistas que alertavam para as dimensões da tragédia em gestação eram considerados alarmistas e defensores de interesses políticos escusos.

Deu no que deu: 300 mil mortos, hospitais com UTIs sem leitos para oferecer aos doentes graves, milhares de pacientes morrendo à espera de uma vaga.

O que acontecerá nas próximas semanas? Chegaremos a 400 mil mortes?

Os hospitais brasileiros estão em colapso. Os infectados foram tantos que abrir mais leitos em UTI é enxugar gelo. Os gestores investem em equipamentos e profissionais para abrir vagas que serão ocupadas em menos de 24 horas.

O número de óbitos em casa e nas unidades básicas de saúde despreparadas para o atendimento é enorme. Os estoques de medicamentos para a sedaçãodos doentes entubados chegam ao fim. Começam a faltar até corticosteroides e anticoagulantes, medicações de baixo custo que o Ministério da Saúde não se preocupou em adquirir.

As vacinas perderam o "timing" para conter a escalada atual. Ainda que fosse possível vacinar todos os brasileiros neste fim de semana, as mortes continuariam a se suceder da mesma forma, pelo menos durante o mês de abril e uma parte de maio.

Vejam a situação de São Paulo, o estado que conta com o sistema de saúde mais organizado do país. No pico da primeira onda, dispúnhamos de cerca de 9.000 leitos de UTI, agora temos 14 mil, lotados. No dia 17 de março havia pelo menos 1.400 pessoas à espera de internação em UTI.

O maior complexo de saúde do Brasil, o Hospital das Clínicas, recebia, em fevereiro, a média de 56 pedidos de internação; nos últimos sete dias foram 364, dos quais 110 estavam em estado grave por outras doenças e 254 por Covid.

Se esse é o panorama no estado mais rico, caríssima leitora, dá para imaginar o caos no resto do país?

Parece que nossos dirigentes despertaram para as dimensões da tragédia que se abateu sobre nós. Empresários e economistas enviaram um recado duro ao presidente, pena que tardio. O ministro da Economia reconheceu que sem vacinação a economia não se recupera. Só agora percebeu? Por que não disse nada em julho, quando nos foram oferecidos os 70 milhões de doses da vacina da Pfizer que o Ministério da Saúde rejeitou? Receio de magoar o chefe?

O presidente da Câmara declarou que "tudo tem limite" e que apertava "o botão amarelo". Amarelo, excelência? Enquanto 300 mil famílias perdiam entes queridos, o sinal estava verde?

Deprimente ver os malabarismos circenses do novo ministro da Saúde, ao justificar que ficava a critério da liberdade milenar do médico prescrever otratamento precoce com drogas inúteis. Como assim, ministro? Enquanto a medicina foi praticada como o senhor defende, os colegas que me antecederam receitavam sangrias e sanguessugas.

Finalmente, sob pressão, o presidente convocou os três Poderes para um convescote político, com o pretexto de criar um comitê para gerir a crise sanitária. Incrível, não? Imaginar que uma equipe comandada por ele será capaz de nos tirar dessa situação é acreditar que mulher casada com padre vira mula sem cabeça.

A consequência mais nefasta de tantos desmandos, caro leitor, foi a de que a epidemia fugiu do controle do sistema de saúde. Daqui em diante, só podemos contar com nós mesmos.

Fonte: Folha de S. Paulo
É com belos sentimentos que se faz má literatura. (André Gide, romancista francês, 1869-1951)

LUGARES

GRUYÈRES - SUÍÇA
Gruyères é uma comuna da Suíça, no Cantão Friburgo, com cerca de 1.608 habitantes, sendo o Francês a língua oficial. Terra natal do mundialmente famoso queijo, situa-se no cantão de Friburgo, nos picos de uma colina. Oferece tudo o que o visitante espera da Suíça: paisagens verdes, casinhas de postal, castelos e um excelente 'fondue'. Para os amantes do cinema e de terror, destaca-se o Museu H.R.Giger, onde se pode ver em tamanho natural o monstro de 'Alien' ou beber uns copos no bar de pesadelo Giger Bar. (wikipédia)

GAMBÁ COM GAMBÁ

Martha MedeirosMartha Medeiros

Que os opostos se atraem, não tenho dúvida, mas compensa essa teimosia? Semanas atrás, conversei com uma mulher inteligente, divertida, com mais de 60 anos e três casamentos nas costas. Ela me disse que até hoje sente falta do primeiro marido, com quem tinha afinidades infinitas e viveu uma relação sólida e longeva. Lamenta ter abandonado esse casamento para sair atrás de aventuras, pois, segundo ela, não adianta querer inventar: Gambá gosta de gambá, elefante gosta de elefante, é assim que os pares funcionam.

Tenho visto muito gambá com coelho, gaivota com jacaré, urso com leopardo, e o resultado dessas parcerias é um misto de excitação com frustração. O diferente nos desafia, mas também nos cansa. É comum nos abrirmos para esse tipo de arranjo quando somos jovens e propensos a viver perigosamente, mas vamos combinar que, depois de tanta batalha para encontrar o amor ideal (supondo que ele exista), melhor encurtar o caminho e se contentar com o óbvio: girafa com girafa, morcego com morcego.

Acredito que alguém que gosta de ler pode se entender com aquele que não gosta, que quem acorda cedo pode se dar bem com quem dorme até o meio-dia, que quem é viciado em esportes pode se encantar por um sedentário – mas um desacordo por vez. Reunir todos esses antagonismos num único casal é provocar o destino. Não tem como ele sorrir para uma dupla de desajustados.

Eu já arranquei o adesivo “vive la diference” do vidro do meu carro. Agora quero seguir viagem com quem celebra as semelhanças.

Em se tratando de amigos, colegas, ídolos e outros que compõem o elenco das minhas relações, a diversidade de ideias e de gostos me atrai. Mas para dividir comigo o volante, intimamente, melhor evitar duelos. Que nós dois gostemos de estrada. Que nós dois gostemos de dormir à noite.

Que nós dois gostemos de sexo. Que nós dois tenhamos uma visão aberta da vida, sem posar de donos da verdade. Que nós dois gostemos de música boa. Que nós dois gostemos de ir ao cinema. Que nós dois não precisemos de muito luxo para ser feliz. Que nós dois gostemos de conversar um com o outro. Que nós dois gostemos de praia. Que nós dois gostemos de natureza.

Que nós dois gostemos de Londres. Que nós dois gostemos de rir. Que nós dois não sejamos preconceituosos. Que nós dois tenhamos consciência de que estamos aqui de passagem e que é preciso aproveitar esse instante. Que nós dois não sejamos carolas nem apegados à dor. Que nós dois sejamos cuidadosos um com o outro, amorosos um com o outro. Que nós dois sejamos honestos. Que nós dois saibamos fazer uso moderado das redes sociais. Que nós dois não sejamos reféns de grifes, mas tenhamos bom gosto. Que nós dois gostemos muito de vinho.

Gambá com gambá.

Fonte: Facebook

FRASES ILUSTRADAS


domingo, 28 de março de 2021

SIM, SE HOUVER DEMANDA

SIM, SE HOUVER DEMANDA
Ruy Castro

Era o que Pazuello e Bolsonaro esperavam para decidir se compravam ou não vacina

Nesta quinta (25), ao ir ao Planetário tomar uma legítima Coronavac —engarrafada no Brasil, certo, mas composta de, entre outros, autênticos cloreto de sódio, hidróxido de alumínio, hidrogenofosfato dissódico e 600 SU de antígeno do vírus inativado Sars-CoV-2 vindos da China—, lembrei-me de uma, entre tantas, imortal passagem do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. Ao ser várias vezes perguntado sobre se o Brasil compraria a Coronavac, e já sem poder fugir à resposta, ele ejaculou a contragosto: "Sim. Se houver demanda".

Isso foi no dia 8 de dezembro. Naquela tarde, o Brasil chegara a 177 mil mortos pela Covid. Passara de 6,6 milhões de casos de infecção e a taxa de ocupação das UTIs do Rio batera nos 100%. E, mesmo diante desses números, o general da Saúde se perguntava se "haveria demanda", caso em que, mas só neste, compraria a vacina. Como Pazuello declarou isso para todo o país pela televisão, fica como um testemunho do interesse que ele e seu amo Jair Bolsonaro tinham pelo assunto três meses atrás.

A composição da vacina acima consta de uma bula da Coronavac que me foi ditada por um amigo médico. Posso imaginar Pazuello lendo essa bula, com aquele jeito de quem move silenciosamente os lábios ao ler alguma coisa e sem entender uma palavra do texto. O que não fazia diferença, porque o verdadeiro ministro da Saúde era Bolsonaro.

Enquanto Pazuello se perguntava se "haveria demanda", uma pesquisa revelava que 69% dos brasileiros já queriam a vacina —qualquer uma. Pois quantos deles não terão morrido porque Bolsonaro se recusava a comprá-la? Hoje, esse número é de 87,4 % —quase 9 em 10 brasileiros. Quantos, pela idade, não terão tempo de chegar a ela?

Ontem, na fila da vacina, entre todos aqueles coroas de máscara, eu identificava em seus olhos uma só sensação: a de esperança. Com certeza, a mesma que eles viam nos meus.

Fonte: Folha de S.Paulo

SÓTER NEVES

SÓTER NEVES

Lembro de ter visto muitos painéis em bares e afins que levavam o autógrafo do pintor Soter Neves. Pessoa simples e respeitosa. Aparentava uns cinquenta anos ou mais. O conheci pelas ruas da cidade quando eu tinha uns quatorze anos de idade. 

Reza a lenda que ele teria feito uma promessa segundo a qual deveria inventar uma piada por dia durante mil dias. 

Andava pelas ruas, como eu disse, e abordava as pessoas, conhecidas ou não, para contar a piada do dia. 

- Sabe da última? … E já complementava com a resposta. 

Era completamente neutro quanto à reação do seu ouvinte. Não ria da suposta piada, não fazia qualquer comentário e não parava para conversar. Simplesmente seguia adiante em busca de novos ouvintes.

Geralmente eu o encontrava pelas imediações da agência dos correios e lembro de algumas vezes que ele me contou a "piada do dia". Eram chistes curtos e rápidos, impregnados de trocadilhos e que levavam no fundo um pouco de humor. Num dia frio ele me perguntou: 

- O que é preciso para Caxias ficar bonita no inverno? e imediatamente deu a resposta: - É só ter neves! 

Noutra oportunidade ele me disse: 

- Eu não escolho as laranjas. Eu só pego as mais bonitas! 

Outra vez formou um trocadilho com pessoas conhecidas do público. Uma era o Sr. Egidio Michaelsen, que fora candidato a governador do RS e a outra era a rádio atriz Linda Gay. 

Depois de dizer o nome dos dois ele concluiu: 

- Formaram uma nova dupla: Micaguei. 

Depois de tantos anos, não sei se ele chegou a cumprir a sua promessa das mil piadas, nem mesmo o motivo da tal promessa. Também não sei como foram seus derradeiros dias. 

Sempre me passou a impressão de se tratar de uma boa pessoa e sobretudo uma pessoa feliz.
As leis se parecem com teias de aranha, que pegam as pequenas moscas, porém deixam passar as vespas e os zangões. (Jonathan Swift)

LUGARES

MAINAU - ALEMANHA
Mainau, a Ilha das Flores, é cercada por mais de 75 hectares de flores das mais variadas espécies, plantas e árvores centenárias, tendo como cenário um céu azul e o Lago de Constança. Somente 7 km separam Konstanz de Mainau. A ilha era propriedade da abadia de Reichenau no século VIII. Em 1272 ela foi doada para a ordem teutônica de cavaleiros. Desde 1932 essa propriedade pertence ao conde Lennart Bernadotte (falecido em 2004) e sua fundação particular (desde 1974), onde sua filha, condessa Bettina, comanda tudo. Ano após ano, a ilha atrai mais de 1,7 milhões de visitantes. A fundação usa os lucros do estacionamento e entrada da ilha não só para financiar os jardins e manter os edifícios históricos, mas também para fins científicos, conservação e proteção do meio ambiente.
Fonte: http://www.porquenaotravels.com/2013/08/mainau-ilha-das-flores.html

VIVA LA VIDA

DAVID GARRETT

FRASES ILUSTRADAS


sábado, 27 de março de 2021

APONTANDO SOLUÇÕES

By Renato Campos Aroeira, desenhista carioca
APONTANDO SOLUÇÕES
Myrthes Suplicy Vieira (*)

Como todos sabem, brasileiro é sempre muito bom para apontar os principais problemas do país mas não costuma se esforçar muito para encontrar soluções para cada um.

Tendo em vista o desânimo generalizado com as crises sanitária, econômica, social e política que vêm atrapalhando nosso sono, decidi sugerir algumas alterações no comando dos ministérios que poderiam ajudar a nos tirar do buraco em que nos metemos acidentalmente.

Convido a todos para acrescentarem suas próprias percepções e sugestões. Alerta importante: todas as indicações têm de ser feitas com base na expertisede cada ministro; apenas nomes técnicos serão considerados.

Mãos à obra:

Tira o Ernesto Araújo e põe o Pazuello nas Relações Exteriores: Ué, não é uma questão de logística colocar embaixadores em postos estratégicos para convencer os organismos internacionais multilaterais (como a ONU e a OMS) e os líderes do G-20 que o Brasil é exemplo de controle da pandemia? Pode ser que ele confunda a Albânia com a Alemanha (um lapso compreensível, considerando que o nome de ambos os países começa com Al), mas pra tudo dá-se um jeito no final, pode acreditar. Outro benefício é que ninguém vai nem notar a mudança de chefia do Itamaraty; afinal, esses dois países são comunistas e nós não queremos mesmo estreitar relações com essa gente.

Tira o Guedes e põe Salles na Economia: Ué, ele não é especialista em passar a boiada enquanto a imprensa está preocupada com o mimimi do negacionismo de Bolsonaro? Aproveita e deixa passar as reformas tributária, administrativa e política.

Tira a Damares e põe ela no Meio Ambiente: Ué, mulher sabe cuidar muito melhor das plantinhas.

Tira o Milton Ribeiro e põe o Augusto Heleno na Educação: Ué, ele não é especialista em segurança institucional? Quer área mais crítica que a educação para garantir que o futuro do país vai estar mais seguro nas mãos de um militar? Além disso, ele vai saber educar melhor nossa juventude a respeito da oportunidade e funcionalidade da decretação de um novo AI-5.

Tira o Marcos Pontes e coloca ele no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos: Ué, ele já foi pro espaço e, portanto, já sabe que a terra é redonda, né? Por isso, ele vai ser muito útil para modernizar as diretrizes do ministério e colocar o Brasil de volta na rota da Renascença, em especial no que tange aos direitos humanos. Além disso, ele vai poder aplicar novas tecnologias na área dos direitos reprodutivos da mulher.

Tira a Teresa Cristina e põe ela no Ministério da Saúde: Ué, lá ela vai poder falar com muito mais propriedade sobre os efeitos benéficos dos gases estufa e dos agrotóxicos para fazer avançar os limites das áreas destinadas à pecuária e garantir uma alimentação mais farta e mais diversificada para as populações mais carentes, sem ter de pagar muito por isso. Além disso, ela deve ter muito mais experiência na vacinação em massa…mesmo que de bovinos.

Pronto, aí está. A lista de trocas sugeridas pode não ser exaustiva, mas certamente servirá de inspiração para a indicação de novas alterações ministeriais.

Nota para os pessimistas de plantão: Se nenhuma dessas trocas funcionar tão bem na prática quanto imagino, sugiro que se tire Bolsonaro e se coloque a neo-zelandesa Jacinda Ardern na presidência. O quê?? Não pode porque ela não foi eleita vice na chapa de 2018? Bobagem! Nada que o STF não dê um jeitinho, né não?

(*) Myrthes Suplicy Vieira é psicóloga, escritora e tradutora.

Fonte: brasildelonge.com
Nenhuma pergunta é tão difícil de se responder quanto aquela cuja resposta é óbvia. (George Bernard Shaw)

LUGARES

CONCARNEAU - FRANÇA

Concarneau é uma comuna francesa na região administrativa da Bretanha, no departamento Finisterra.