José Horta Manzano
Pobre Brasil, obrigado a viver sob o mando de um grupelho de incompetentes. Se a situação já é dramática ao natural, o molho de pimenta da epidemia só fez piorar. O prato ficou intragável. Hospitais transbordando, presidente apinhando praias, doença se alastrando – tudo sem solução no imediato.
Ao despreparo do presidente e de seus pajens, somam-se baciadas de má-fé. Antes da pandemia, até que dava pra ‘passar boiada’ sem que o povão se desse conta. Hoje ficou impossível. Com a intenção de criar factóides e distrair a plateia, Bolsonaro profere enormidades. Mas não tem jeito: no dia seguinte, a covid e seus desdobramentos voltam ao centro do noticiário.
Num dos raros momentos de verdade que a política nacional nos tem oferecido, um intimidado aprendiz que ostenta o título de ministro da Saúde deu a dica: “– Um manda, o outro obedece”. Com isso, revelou que seu papel é de boneco de ventríloquo, aquele que só mexe a boca pra ampliar a fala de seu mestre. O país entendeu que essa é a mecânica vigente entre o chefe e todos os ministros e assessores. Todos ecoam o pensamento do capo. Portanto, a trapalhada que hipoteca a saúde e a vida de 210 milhões de brasileiros é obra da mente solitária e maligna de Sua Excelência, o presidente da República.
Se hoje faltam vacinas, seringas, ampolas, supercongeladores e centros de vacinação, não se ponha da conta da Anvisa ou do Ministério da Saúde. O responsável tem nome e endereço: é doutor Jair Bolsonaro, o presidente por acidente.
Ele tem instilado no povo o receio de receber vacina e virar jacaré ou outro bicho. Ou bicha. Parece que essas enormidades têm feito crescer o campo dos antivax, aqueles que são contra a vacinação. Gente que recusa imunização não é novidade: esse grupo existe desde que a vacina contra a varíola apareceu, faz dois séculos.
No entanto, ao fim e ao cabo, o instinto de conservação costuma falar mais alto. A lógica é elementar. O cidadão hesitante vai pôr na balança as vantagens e desvantagens da imunização e vai chegar à conclusão de que o risco de não se vacinar e apanhar uma forma grave de covid é bem maior do que o risco de se vacinar e desenvolver uma forma grave de reação à vacina. Dos males, o menor.
À medida que o programa avança, com milhões e milhões de cidadãos imunizados, a resistência dos antivax diminui. É irônico pensar que grande parte desse povo que é «do contra» não faria mais parte deste mundo se não houvesse vacina; já teriam morrido de varíola, tuberculose ou outras doenças infecciosas que a vacinação praticamente varreu do planeta.
Nessa história de vacina, a incompetência estrutural de nossos governantes, aliada à natural preguiça dos que são cercados por mordomia, nos pôs em situação bicuda. Doutor Bolsonaro, sacerdote-mor da nação, vetou a Coronavac por ser de origem chinesa (e principalmente por ser produzida num estado governado por um desafeto). Vetou essa, mas não encomendou nenhuma outra. Imaginava que os fabricantes bateriam a nossa porta implorando por uma encomenda.
Não lhes passou pela cabeça que o mundo inteiro está correndo atrás de vacina. Laboratórios estão sobrecarregados e não dão conta. São, em teoria, 7,5 bilhões de humanos a imunizar. A população brasileira não chega a 3 porcento desse total. Como costuma acontecer quando o assunto é encontrar o lugar do Brasil no mundo, a turma do Planalto errou. As encomendas tinham de ter sido passadas seis meses atrás. Agora, a fila é longa. As compras que forem feitas agora têm pouca chance de ser entregues no primeiro semestre.
Mas tem nova vacina despontando. Chama-se Soberana e está em adiantada fase de desenvolvimento. Deve estar disponível já neste primeiro semestre de 2021. Poderia ajudar a sanar os erros cometidos por nossos imbecis de plantão. Ainda não há fila, o que é boa notícia. Só tem um pequeno defeito, que periga desagradar a doutor Bolsonaro: está sendo desenvolvida em Cuba. Mas será que, sempre preocupado em primeiro lugar com a saúde do próprio povo, ele não faria uma exceção e passaria por cima da ideologia pelo menos desta vez?
Fonte: brasildelonge.com
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