terça-feira, 12 de janeiro de 2021

NÃO FOI SÓ NA VACINA QUE O BRASIL FALHOU

NÃO FOI SÓ NA VACINA QUE O BRASIL FALHOU
Ronaldo Lemos

Prevaleceu a espetacularização, a balbúrdia; falhamos em tudo; mais do que nunca, permanecemos como terra em transe

É revoltante que ainda não tenha começado a vacinação contra a Covid-19. Isso em si demonstra o despreparo e o descaso com relação à doença. No entanto, não foi só na vacina que falhamos. Ignoramos absolutamente todas as estratégias de controle da doença adotadas com sucesso em outros países.

Agora, o foco no Ocidente é vacinar. No entanto, muitos são os países que não estão com pressa de fazer isso, uma vez que conseguiram controlar a Covid-19 por outros meios.

Pegue-se o exemplo da Coreia do Sul. A estratégia do país foi muito clara desde o início. Testagem de massa permanente da população. Com isso, foi possível determinar infectados assintomáticos, colocando-os em isolamento, bem como as pessoas que tiveram contato com eles.

Resultado: o país teve, ao todo, 67 mil casos de Covid-19 e 1.081 mortes, para uma população de 51 milhões de habitantes. Por que descartamos a testagem de massa? Por que não se falou mais disso no Brasil?

Outro exemplo humilhante para nós é o caso do Vietnã. O país de 95 milhões de habitantes é hoje a 40ª economia do mundo (o Brasil permanece como a 9ª). Desde o início da pandemia, houve 1.509 casos de Covid-19 e 35 mortos.

Qual foi a estratégia do país? Uma campanha permanente coordenada pelo governo central, que levou ao uso de máscaras e ao hábito de lavar incessantemente as mãos. Tudo conjugado com uma organização de 45 times de resposta espalhados pelo país, sediados em 31 hospitais privados.

No processo, o Vietnã desenvolveu seu próprio teste de Covid-19 para não precisar importar. Agora, com toda a calma do mundo, está finalizando sua própria vacina a ser aplicada nacionalmente em seis meses. Por que descartamos uma coordenação nacional abrangendo todo o país? Por que abrimos mão de ousar?

Outras regiões em que a palavra “pandemia” ficou para trás incluem Singapura, Taiwan, Hong Kong, a própria China e o Japão.

Nesses países, uma das estratégias foi o uso intenso da tecnologia para controle da Covid. O uso de aplicativos que permitiram controlar a circulação e isolar rapidamente os infectados e todos aqueles que tiveram contato com eles. Além disso, todos adotaram medidas estritas de lockdown na hora certa e por curtos períodos.

Por que o Brasil desistiu na largada de usar a tecnologia para prevenir a Covid? Por que ficamos no “abre e fecha” de forma errática e ineficaz?

Entre nós, prevaleceu a espetacularização, a balbúrdia, a preguiça e a polêmica. Sem conseguir definir uma estratégia para combater a Covid, caminhamos à deriva, realizando a frase de que “nenhum vento ajuda quem não sabe a que porto veleja”. No momento, não há sequer seringas disponíveis para aplicar a vacina.

O resultado ficará gravado para sempre na história. Mais de 200 mil mortos até o momento, milhões de casos e sem perspectiva de retorno à normalidade social e econômica. Ignoramos tudo o que deu certo no combate à doença. Falhamos em tudo e, em particular, na tarefa de construir nosso próprio caminho.

Mais do que nunca, permanecemos como terra em transe.

Fonte: Folha de S. Paulo

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