Fabio Vendrame
Como era de se esperar, alguns professores de idiomas diversos não gostaram da última crônica de nosso célebre viajante. Para os que não se lembram, mr. Miles ensina a uma leitora assustada com problemas de língua que o importante é se fazer entender – e não, necessariamente, dominar o vernáculo. Mr. Miles aceita as críticas, com sua fleuma tradicional, mas manda dizer que, como ele mesmo fala algumas dezenas de idiomas (“nem todos com maestria, como vocês podem reparar observando a pobreza do meu português”), não se pode acusá-lo de um inimigo do conhecimento.
“Aliás, de qualquer conhecimento, as you know”. De outra parte, o correspondente britânico agradece aos inúmeros leitores que se divertiram com as histórias por ele contadas na semana passada. Um deles, lembrando-se da história da avó de Ronny Hein – amigo brasileiro de mr. Miles –, comentou:
“Pior ocorre com a minha nonna. Ela nunca aprendeu o português, mas já esqueceu quase todo o seu italiano nativo. Fala, portanto, um idioma peculiar e particular”.
A seguir, a pergunta da semana:
Mr. Miles: lendo seus comentários sobre a Geórgia, fui consultar um mapa-múndi e me surpreendi ao saber que a Geórgia é considerada parte da Europa, embora fique centenas de quilômetros a leste do Estreito de Bósforo, que é onde, teoricamente, começa a Ásia. Como se explica isso? (Ricardo Kovalic Torres, por e-mail)
“Well, my friend: são convenções, apenas isso. Suponho que os critérios de quem definiu essas divisões levavam em conta, for instance, a cor da pele da população predominante. Sendo os georgianos caucasians, seria difícil considerá-los “orientais” ou asiáticos. Da mesma forma, como grande parte dos turcos da Anatólia tem a pele mais morena e os traços comumente mais associados a povos orientais, ficou estabelecido que os territórios a oeste do Bósforo já constituiriam um novo continente.
That’s all foolery, Richard. Basta olhar o mapa e você perceberá que, exceto por nossas ilhas, que encabeçam o território com um ligeiro e oportuno distanciamento dos gauleses, a Europa e a Ásia são uma única porção de terra pela qual, thank God, espalham-se povos diferentes, com valores peculiares, gastronomia própria, crenças e hábitos distintos. That’s amazing, isn’t it?
Não há oceanos a separar essa gente toda. É apenas um longo e contínuo caminho sem qualquer monotonia. Muda a arquitetura. Mudam os templos. Mudam os trajes. O idioma que se fala aqui já não é compreendido depois daquela montanha. O alfabeto que se utiliza nessa margem do rio não é o mesmo do lado oposto. Até o tempo é outro: o calendário que orienta a vida desse povoado difere do que é utilizado pela aldeia vizinha. I love it. É um mundo fascinante como um jardim florido de cores, tamanhos e aromas variados.
Eis o prazer e o mistério de viajar: nossas próprias convicções apresentadas às dos outros e com elas confrontadas; a oportunidade de aprendermos e de ensinarmos. Sobretudo, of course, a chance de se divertir com gente diferente e… oh, My God! My apologies, Richard! Você fez uma pergunta quase técnica e eu acabei me perdendo em devaneios. Deve ser o vento da primavera que começa a soprar.”
Fonte: O Estadão
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