Lugares em que a vida fala diretamente com você
Nosso incansável viajante deixou Antígua
(e Barbuda) porque foi convidado a passar o carnaval em Port of Spain
por seu velho amigo Anthony Carmona, hoje presidente do idílico
arquipélago de Trinidad e Tobago. Disse-nos mr. Miles que a mistura de
rum com marimbas não lhe foi muito palatável. “Espero conseguir ouvir de
novo até [...]
Nosso incansável viajante deixou Antígua (e Barbuda) porque foi convidado a passar o carnaval em Port of Spain por seu velho amigo Anthony Carmona, hoje presidente do idílico arquipélago de Trinidad e Tobago. Disse-nos mr. Miles que a mistura de rum com marimbas não lhe foi muito palatável. “Espero conseguir ouvir de novo até a Páscoa, my friends!”. A seguir a correspondência da semana.
Nosso incansável viajante deixou Antígua (e Barbuda) porque foi convidado a passar o carnaval em Port of Spain por seu velho amigo Anthony Carmona, hoje presidente do idílico arquipélago de Trinidad e Tobago. Disse-nos mr. Miles que a mistura de rum com marimbas não lhe foi muito palatável. “Espero conseguir ouvir de novo até a Páscoa, my friends!”. A seguir a correspondência da semana.
Mr. Miles: basta ler um guia de boa qualidade para saber
quais atrações turísticas merecem ser visitadas em qualquer país. O
senhor, que viaja tanto, poderia me dizer o que mais é indispensável
fazer em um primeiro contato com um novo lugar? (Celiana Armandez Giggo,
por e-mail)
“Well, my dear, sua pergunta esconde os melhores segredos de um viajante. Yes, of course:
é preciso visitar os protagonistas de uma cidade ou de um país. Os
monumentos pelos quais são conhecidos, as paisagens que deles até se
tornaram lugares-comuns. Como ir, for instance, a Veneza e não observar, com detalhes, uma gôndola? Ou visitar o Egito passando ao largo das pirâmides de Gizé?
Na minha humilde opinião de eterno peregrino, however, o
melhor jeito de conhecer um lugar é reviver, alhures, o seu próprio
cotidiano, mas, dessa vez, prestando muita atenção – já que o que se
torna rotina em casa acaba incorporado à cabeça como mais um fio de
cabelo em uma vasta juba.
Vou tentar lhe dar algumas dicas, lembrando que elas podem variar
muito de país para país e de acordo com o entendimento do idioma em
questão. Comece pelo dinheiro local, que você vai adquirir na chegada.
Veja seus desenhos, suas cores, referências. As cédulas costumam mostrar
heróis nacionais, exibir as riquezas da natureza de cada lugar e falam
até da alma do povo.
Na Polinésia francesa, por exemplo, o franco local é colorido com
toda a variedade da natureza luxuriante daquele arquipélago. O escudo
português, em tempos salazarianos, era triste e melancólico como um
fado. E as falecidas liras italianas tinham tantos zeros que era difícil
contar. Nada parecido, by the way, com uma nota que tenho guardada em casa. Valor? 100 trilhões de dólares! Do Zimbabwe, unfortunately. A maior já emitida no planeta, durante a hiperinflação de 2008. Com ela, however, mal se comprava um pacote de biscoitos no supermercado.
E, falando em supermercados, dear Celiana, não deixe de entrar em um deles, não importa aonde. Haverá, of course,
produtos globalizados nas prateleiras. Mas grande parte dos itens à
venda dirá muito sobre o modo como os habitantes do lugar alimentam-se,
limpam suas casas e fazem sua higiene. Entrar em um supermercado, de
certa forma, é como entrar na área íntima de uma residência.
Indispensável é comprar um jornal, mesmo que você não entenda
patavinas! O aspecto do jornal, o peso que se dá a cada seção, tudo é
informação privilegiada sobre quem vive na cidade ou no país.
Se, for instance, você encontrar oito páginas sobre cricket
e nenhuma menção ao futebol, é melhor não citar Pelé ou Neymar como
referências. Os mercados também são indispensáveis. Neles você verá a
fartura ou a escassez de cada povo. As frutas que se come por ali, as
carnes, os peixes. E, of course, a maneira como vendedores e compradores
se entendem.
É uma mágica! No cotidiano (muito mais do que na atração turística) é
a vida que fala diretamente com você. Nas roupas que as pessoas usam,
no jeito que elas rezam (vá, sempre, a um serviço religioso, seja lá
qual for a crença local) e nas coisas que fazem nas praças. Escolha um
banco em um parque movimentado. Você vai ver se as pessoas têm pressa ou
se são serenas. Verá como brincam as crianças, como comportam-se os
idosos, o quanto riem ou são silenciosas aquelas populações. E, last but not least, conforme o lugar onde estiver, você terá a chance de olhar (ainda que discretamente) como agem os enamorados. E assim, my dear, sua viagem será, sem dúvida, ainda muito melhor.”
Fonte: O Estadão
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