segunda-feira, 15 de junho de 2020

EGOTRIP

Martha Medeiros

Só quando meus amigos já usavam o Facebook havia 10 anos, é que criei meu perfil. Sou lerda para as questões tecnológicas. Fui a última a ter videocassete, trocar LP por CD, ter carro com câmbio automático, usar o Netflix, entrar no WhatsApp, e, se isso se presta a uma análise, fique à vontade para me revirar pelo avesso. Resistência ao progresso? Preguiça? Diagnostique por mim.

Pois adivinhe minha última façanha. Quando percebi que até os aborígines da Tasmânia tinham perfil no Instagram e eu não, resolvi aceitar o empurrão de uma amiga antenada que fez minha inscrição. Inscrição? Hahahá. Sei lá como se diz. Minha abertura de conta? Acho que é isso. Minha abertura de conta, como se fosse um banco. Custei a fazer pagamentos online também.

Então, no ensolarado 8 de outubro de 2017, fiz minha primeira postagem.

A rendição se deu porque me afirmaram que o Instagram é mais ágil que o Face, que há muitos perfis falsos com meu nome, que tenho fãs e eles gostam de ver fotos de seus ídolos, que é a mais moderna plataforma de lançamentos, eventos etc., e, afinal, qual o problema, mulher? O que custa marcar presença em mais uma rede?

O mundo é virtual.

No Face, eu falo sobre os shows que assisto, comento sobre alguns livros, dou pitacos gerais, divulgo sessões de autógrafos e palestras, faço tietagem explícita com artistas e amigos, posto fotos de viagens. Me consolo pensando que a maioria dessas postagens funciona como dica cultural. Ainda assim, não me iludo, reconheço a vaidade que há nisso tudo, mas ela nunca foi tão evidenciada como agora que entrei no Insta (adoro essa intimidade). Insta é 100% egotrip.
Fotos e mais fotos numa atualização delirante.

Não é pecado. É só analisar os perfis dos outros, está tudo ali: o que comem, o que vestem, o que pensam, registros da festa de ontem, da infância, das férias, enfim, uma overdose de si mesmo, uma comprovação de existência a cada meia hora, é o universo da autoidolatria em que me meti também e nem posso criticar, agora faço parte disso.

Dá um pouco de vergonha, mas ela se dilui em meio a uma turma de pessoas inteligentes que está nessa sem encanar e sem perder o sono. Em tese, todos sabem que nosso valor não se mede pelo número de seguidores e curtidas que se recebe, é apenas uma estatística que conta, caso alguém queira nos prestigiar – ou patrocinar. Pois é. Estamos no marqueteiro 2017, não no romântico 1952, não no revolucionário 1968, esses anos amarelados pelo tempo.

@realmarthamedeiros. É meu endereço no Insta, caso queira conferir minha adesão ao que me avexa e me diverte ao mesmo tempo.

O "real" me foi sugerido porque há muitas irreais de mim por aí, dizem. Juro por Steve Jobs que tenho tentado achar tudo isso normal.

Fonte: Zero Hora: 25/10/2017

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