Ruy Castro
Um conselho: se estiver a fim de vir ao Rio, venha logo. Não que estejamos em risco de perder o sol, o mar, a luz do inverno, o contorno das montanhas e outras atrações de autoria da natureza. Mas, com Marcelo Crivella como prefeito, tudo mais corre o risco de desaparecer. Ele não gosta da cidade.
Para começar, não conhece o Rio. Pode saber tudo de Tebes, Jericó ou Jerusalém, pelos anos que levou decorando o Velho Testamento, mas não sabe nada de ruas como a da Quitanda, o Ponto de Cem Réis ou a ladeira do Quebra-Bunda. Tem também mais intimidade com a África, onde foi, segundo diz, missionário, do que com a história da Pequena África, nos arredores da antiga praça Onze, onde se gestou o samba. Como não conhece nosso patrimônio histórico e cultural, Crivella o despreza ou trabalha para derrubá-lo. O Carnaval, por exemplo, seria mais tolerável se tocassem "Mamãe Eu Quero" em ritmo de gospel.
Em sua campanha à prefeitura, ele pregou que vinha para "cuidar das pessoas" —uma cotovelada na administração anterior, que se especializou em obras. Bem, sob Crivella, o Rio está batendo recordes de moradores de rua, e não adianta botar a culpa no desemprego. O que ele está fazendo para criar empregos e gerar riqueza?
Mas o que Crivella está mais exigindo dos visitantes é que, ao passear pelas ruas do Rio, exibam seus dotes de contorcionistas —para driblar as bancas de camelôs ou não pisar em todo o tipo de muamba espalhada sobre as calçadas. Entregue aos ambulantes, a cidade está aberta ao contrabando, ao roubo de cargas e à pauperização do comércio organizado, aquele que paga impostos e mantém empregados.
Crivella parece não gostar do comércio organizado. Mas com uma exceção: tente botar uma banquinha de Bíblias na porta de seu templo para ver se o pastor vai gostar.
Fonte: Folha de S. Paulo - 18/08/2017
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