Martha Medeiros
Há 16 anos, publiquei um texto no
Dia dos Namorados intitulado “O dia do amor”. Eu defendia o 12 de Junho como
uma oportunidade para celebrar os sentimentos, as emoções, o afeto, enfim, tudo
o que une duas pessoas, não importando qual o seu sexo. O resultado foi uma
chuva de mensagens calorosas e concordantes. Na época, me chamou a atenção o
fato de eu não ter recebido xingamentos ou reações preconceituosas. Pensei:
estamos evoluindo.
De fato, 16 anos atrás estávamos
mais adiantados.
Hoje, deparo com essa onda
moralista de solicitar boicote pra novela, boicote pra propaganda, boicote pra
qualquer coisa que envolva cenas de homossexualidade e tento entender a razão
do retrocesso. Avançou-se demais, foi isso? Parece que foi isso.
Enquanto o assunto ficava
restrito a teorias, era fácil ser civilizado. Aceitava-se que homossexuais
pudessem jantar fora e trocar presentes no dia em que todos os namorados faziam
o mesmo, desde que longe dos olhos da família tradicional brasileira. Ficando
no gueto deles, tudo certo.
Hoje, os personagens gays da tevê
não são caricatos, se beijam, trabalham e têm família – credo, até parecem
normais. Foi só dar a mão que eles tomaram o braço.
Deve ser esse o pensamento de
quem se escandaliza com um comercial singelo como o do Boticário ou com o fato
de duas octogenárias trocarem um selinho na novela das nove. Acredita que
invadiram seu latifúndio e agora tenta evitar que o inimigo tome posse. Que
inimigo? Também não sei.
Entendo que muitas pessoas se
sintam constrangidas diante de cenas de carinho explícito entre gays. É algo
ainda novo e estima-se que o costume com a situação venha com o tempo, mas o
que me espanta é que 16 anos atrás não se fazia tanto escarcéu. Nas redes
sociais, hoje, é comum publicarem pérolas como “a Globo está em campanha para
nos empurrar goela abaixo a homossexualidade, só porque lá dentro tem um monte
de gays”. Pois é, nas outras empresas, não tem. Dentro das famílias, não tem.
Na praia, não tem. Nas academias, não tem. Nas universidades, não tem. Nas
favelas, não tem. Só dentro da Globo. Só artista é gay. Engenheiros,
professores, advogados, atletas, políticos, empresários, jornalistas,
cozinheiros e demais profissionais estão imunes. Houve alguma campanha de
vacinação?
Até o Papa flexibilizou, mas não
adianta: em nome da religião, logo dela, segue-se difundindo por aí a
intolerância e a mesquinhez. Luta-se contra algo que jamais vai acabar: a
pulsão de amor e desejo entre dois seres humanos, que é coisa bem antiga.
Novidade é este desespero agora. Algum hétero está sendo convocado a aderir ao
mundo gay? Que eu saiba, todo mundo continua livre para viver sua sexualidade
como preferir.
Taí uma discussão que perdeu o
timing. Acabou ficando meio ridícula.
Fonte: Facebook
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