A jabuticaba não é exclusiva do Brasil. Mas a arrogância, a pretensão e a ignorância querem ser
Cinquenta anos
depois, algumas ideias sobre o passado são tão dadas de barato e repetidas sem
verificação que, certas ou erradas, cristalizam-se e recebem sua sentença de
morte: tornam-se ideias-feitas. E erradas. É o caso de determinadas ocorrências
de 1967, que a posteridade passou a descrever a seu modo e não como
aconteceram.
Daí, diz-se hoje que a Jovem Guarda foi um movimento contestador da juventude –a querida Wanderléa, por exemplo, parece acreditar que suas minissaias desafiavam as famílias. Ao contrário: eram vendidas até no camelô, juntamente com as cafonérrimas calças Calhambeque e Tremendão de Roberto e Erasmo Carlos. O máximo que a Jovem Guarda fez pela cabeça de seus seguidores foi obrigá-los a metê-las em toucas para espichar suas melenas.
Diz-se também que "Terra em
Transe", de Glauber Rocha, foi uma bofetada no regime militar. Ao
contrário, na época indignou mais as esquerdas, que não gostaram de suas
ambiguidades, nem de seu tom delirante e alegórico, "incompreensível para
as massas". E, outro dia, um jornal definiu Leila Diniz como "um
ícone do feminismo". Leila, feminista? Não em vida. As feministas não
gostavam dela, porque Leila se dava bem com os homens – bem até demais.
Há anos ouço dizer que "O
Rei da Vela", peça de Oswald de Andrade montada no Rio pelo Oficina,
chocou a plateia de 1967 pelos palavrões. Ao contrário, a plateia do Teatro
João Caetano delirava com os palavrões –sei disso porque estava lá. E li também
há pouco que, em 2017, comemoram-se os 100 anos da amizade entre o mesmo Oswald
e Mario de Andrade. Será? Segundo Jason Tércio, em sua magnífica biografia de
Mario a sair este ano, Mario rompeu de vez com Oswald em 1929, farto das
humilhações e piadas do ex-colega.
Ideias-feitas são confortáveis.
Dispensam-nos de pensar.
Fonte: Folha de S. Paulo - 06/05/2019
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