Voltar ou não voltar? Eis a
questão.
Nosso solerte viajante, em mais
uma jornada africana na companhia de Trashie, sua mascote cega que vê tudo com
grande acurácia, encontrou, em sua caixa de mensagens, um libelo valente de uma
de suas leitoras.
Dizia o texto, em tom
legislativo: "Todo cidadão do mundo deveria ter direito a conhecer pelo
menos cinco países (à sua escolha). Subsidiado pelo governo de seu país ou com
crédito consignado". A poderosa frase é a parte mais relevante do email
que dona Deodora Pachicoski enviou para Mr. Miles.
O correspondente britânico
respondeu de maneira lacônica:
"Indeed, milady!". E
pediu para que avisássemos à dona Deodora que, caso ela queira fazer um
abaixo-assinado sobre o assunto, ele quer estar entre os primeiros signatários.
A seguir, a pergunta da semana:
Querido Mr. Miles: meu pai sempre
diz que nunca devemos voltar a um lugar em que fomos muito felizes. Ele
acredita que retornar pode quebrar o encanto. Gosto da frase dele, mas não sei
se concordo. Qual é a sua opinião?
Ingrid Folgher, por email
Well, my dear: diga a seu pai que
considero sua declaração muito poética. E ouso imaginar que ele já passou por
esse lugar (qual: Paris, Buenos Aires, Miami?) aonde foi tão integralmente
recompensado que ele prefere mantê-lo intacto em sua cabeça.
Considero uma verdade, portanto,
que ele tenha sido muito feliz nesse lugar x. Já a sua ilação de que nunca mais
passará pela mesma alegria no mesmo destino é falsa e carece, portanto da
própria confirmação que, aparentemente ele não fez.
Uma frase de Tahir Sha, jovem
escritor inglês de origem asiática, com uma infinidade de fãs, explica melhor o
que estou tentando dizer:
"Não voltar significa
auto-exilar-se", pontificou o novelista inglês — em outra frase de efeito
poderosa.
Em outras palavras, a alegria de
voltar para onde quer que seja representa liberdade absoluta e inquestionável
para o viajante. Concordo, however, que a vida seja repleta de surpresas, mas a
felicidade a que seu pai se refere pode estar na próxima esquina. Toda viagem é
uma confluência poderosa entre o lugar, a companhia e as circunstâncias.
Qualquer pessoa que viaja com alguma frequência sabe disso.
Se você for a um lugar que a
encanta e a companhia (pode ser um amigo, um parente or whatever) aborrecê-la,
o prazer da viagem lhe parecerá, unfortunately, menor. Se, porém, a companhia
for ótima e as circunstâncias adversas — greve nos transportes, chuva
intermitente, frio descabido ou calor congolês, só para citar algumas — você
poderá captar toda a felicidade possível de sua viagem, mas ainda assim ficará
com uma dúvida. E se eu voltar em um momento melhor? Sem chuva, greves etc?
Of
course, darling: é assim que se faz! Se não dermos a chance para que uma viagem
seja refeita — como seu pai supõe —, jamais saberemos se a experiência foi
igual, pior...ou melhor! Pode ser qualquer das três opções e um otimista
certamente concordaria em correr o risco.
Quero dizer com isso, my dear,
que até a alegria que a gente julga ser a maior possível, pode ser superada, se
estivermos com o espírito preparado para que isso aconteça. Meu velho e bom
amigo Rubinstein (N.da R: Arthur Rubinstein, pianista virtuose, falecido em
1982) tinha uma frase quase tão linda como suas interpretações de Brahms e
Chopin:
"Se você ama a vida, ela vai
amá-la de volta.", disse-me o músico polonês, que virou cidadão americano
e acabou morrendo em Genebra, na Suiça.
A citação, of course, dispensa
comentários. Mas, de algum jeito, invade o raciocinio poético de seu pai.
"Se você ama um lugar, ele vai amá-lo de volta", é, a meu ver, a
interpretação que um bom viajante deve dar à máxima de Rubinstein. In other
words, se seu pai foi a um lugar maravilhoso e voltou apaixonado, o mais
provável é que ele seja retribuido com o mesmo amor ao retornar. Porque a
poesia que o raciocínio dele involve, significa que ele já ama o tal lugar e —
foi correspondido. Tenho certeza de que seu pai entenderá seu raciocinio.
Fonte: Facebook
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