Martha Medeiros
Ontem minha filha embarcou num
avião para uma viagem ao Exterior sem data de retorno. Está realizando um sonho
antigo, mas que se tornou premente nos últimos meses. Formada, inquieta,
faminta por novas experiências de vida, acumulou salários, vendeu alguns
pertences, passou madrugadas pesquisando as menores tarifas de passagem e
hospedagem, arrumou a mala e se foi.
Muitos pais têm vivido essa
ruptura: ver seus filhos partirem em busca de mais conhecimento e
amadurecimento, jovens que precisam abandonar o ninho para um voo solo a fim de
descobrirem uma nova direção e um ponto de vista que os surpreenda. Querem
nascer de novo, agora sem cordão umbilical de nenhuma espécie.
O mundo deu uma encolhida. Pelo
WhatsApp, ela poderá postar o que está almoçando, pelo Skype verei seu novo
corte de cabelo, pelo Face irei acompanhar suas fotos e bateremos papos
digitais, coisa, aliás, que absurdamente já fizemos estando ela no seu quarto e
eu na sala. Então, o que significa, mesmo, distância?
Nos dias atuais, as distâncias
tornaram-se bem menos dramáticas, não há mais invisibilidade e silêncio,
estejamos a poucos metros ou a muitos quilômetros da pessoa amada. O toque
continua restrito aos corpos presentes, mas já não perdemos ninguém de vista. E
isso nos libera para sofrer menos e pensar com mais positivismo sobre as
separações.
Desde que a colocaram nos meus
braços, na maternidade, percebi em seus olhos que ela não se conformaria com os
limites impostos pela segurança de uma vida regrada. Sempre considerou o mundo
seu quintal. A palavra estrangeiro nunca encontrou lugar em seu vocabulário.
Todos os seus objetivos foram tratados como realizáveis, independentemente de
onde, de quando, de quem, de como.
Os filhos voltam, quase todos.
Nem que seja para nos visitar. Se ela não vier, eu irei até ela, não é esta a
questão. O que me sensibiliza é que a nossa vida está mudando – mais uma vez.
Um ciclo se encerra para dar início a outro. A família até então estruturada se
decompõe para que cada um de seus membros forme outros núcleos, novas rotinas.
Ela voltará um dia, mas para morar em seu próprio apartamento. Ou voltará para
morar em São Paulo. Ou voltará casada. Voltará – mas nunca mais a mesma. O que
vivemos juntas nesses últimos 23 anos virou memória desde ontem. A partir de
agora, estaremos iniciando uma viagem inédita ao futuro, estando aqui ou
estando fora.
Não posso ficar triste, mesmo com
o coração apertado. É da vida esse chamado, que é atendido por aqueles que têm
coragem de partir e mais coragem ainda de chegar. De chegar neles mesmos, que é
onde cada um, não importa a via escolhida, confirma a razão da própria
existência.
Fonte: Facebook
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