Em sua capa de
fevereiro de 1962, criada por Glauco Rodrigues, a revista "Senhor"
mostrava um arlequim estilizado –traços do chapéu, da máscara, da roupa de
losangos– e a frase: "Ele vem aí". Mais nada, nem precisava. Era o
Carnaval. Aquele número da "Senhor" trazia ficção por Isaac Bashevis
Singer, humor por João Bethencourt, a poesia de João Cabral, grandes cartuns de
Jaguar e altas prosopopeias de Paulo Francis sobre psicanálise. Nada disso
mereceu chamada de capa. Ele vinha aí.
A imprensa carnavalesca do Rio
tem 150 anos. Podem-se compor grandes antologias com seu material e, uma delas,
de 1943, organizada por Wilson Louzada, era estrelada por Manuel Antonio de
Almeida, Machado de Assis, Arthur Azevedo, Olavo Bilac, João do Rio, Dante
Milano, José Lins do Rêgo, Marques Rebêlo, Lucio Cardoso, Rubem Braga, Jorge
Amado, Jorge de Lima. Todos escreveram maravilhas sobre o Carnaval.
Mas esses eram os ilustres, que
viam a festa de fora. Os verdadeiros cronistas do Carnaval eram os repórteres
de 1900, que cobriam os clubes, ranchos e cordões, sentiam-se tão foliões
quanto jornalistas e se assinavam Vagalume, Peru dos Pés Frios, A.Zul,
K.K.Reco, K.Noa. Seus descendentes foram Lucio Rangel, Jota Efegê, Eneida de
Moraes e tantos outros, que, cada qual à sua maneira, anotaram tudo que
puderam.
O ideal é quando os eruditos
vergam sua metodologia à suada realidade dos fatos. Foi o que fizeram Suetônio
e Rachel Valença ao escrever "Serra, Serrinha, Serrano – O Império do
Samba", publicado em 1981 e relançado agora (Record, 433 págs.), acrescido
de 33 Carnavais. Aqui está tudo sobre o Império Serrano: seus homens, mulheres,
cantos, ritmos, festas, lutas.
É uma aula, mas não só. É também
uma história de amor, num barracão a 45 graus, entre uma historiadora –Rachel–
e uma escola de samba.
Fonte: Folha de S. Paulo
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