Como tornar-se um fotógrafo de
viagem
Nosso incansável viajante
recuperou o bronzeado com uma semana nas Ilhas Canárias. Com o que chama de
"couro curtido por duas guerras mundiais, sendo uma delas nas areias do
deserto em El Alamein", Mr. Miles diz que, possivelmente, nem precisa de
protetor solar. Já Trashie, sua raposinha das estepes siberianas, não dispensa boné,
óculos escuros e whisky gelado em suas incursões à praia.
A seguir, a pergunta da semana:
Mr. Miles: meu sonho é ser um
fotógrafo de viagem. O que devo fazer para alcançá-lo?
Felipe Olivença, por email
Well, my friend, tenho muitos
amigos que militam nessa profissão e, therefore, sinto-me à vontade em
responder a sua questão. Se fossem outros tempos, eu diria, sem pensar, que o
único equipamento necessário para um bom fotógrafo viajante é seu olhar. É preciso
ter olhos amplos e repletos de luz, como uma lente grande angular. Faz-se
fundamental a capacidade de escarafunchar cada quadro da emoção e aplicá-lo ao
que vê: à paisagem, às pessoas, aos detalhes. Assim como Pelé enxergava as
frestas entre os jogadores adversários e as perseguia para fazer suas jogadas
geniais, você teria, as well, de ver até o que não aparece aos olhos dos
outros, para lograr um instantâneo diferente, daqueles que paralisados em uma
página de papel são, de fato, originais e surpreendentes.
Nem preciso dizer, of course, que
é preciso ser um grande viajante. Se possível daqueles que está sempre com a
máquina ao alcance de uma piscadela, para que a surpresa de um instante fugaz
não escape de seu olhar.
Há, também que ser determinado, intimorato
e capaz de enfrentar situações penosas ou cômicas. De furtar fotos no interior
das igrejas mais belas e fugir correndo da ira dos párocos que vendem os
direitos (sem nenhum direito) das pinturas e esculturas que foram produzidos
para encantar os fiéis. De driblar, com finta estonteante, os burocratas que
exigem autorizações para clicar próprios públicos, sobretudo em países
"papeleiros", que precisam dar emprego a uma multidão de funcionários
com carimbos.
De submeter-se à ira dos que se
sentem agredidos por uma foto, porque estão prevaricando em logradouros aonde
temem ser localizados. De aguardar o brilho intenso das luzes que aparecem ao
lusco-fusco — ainda que à mercê de frio intenso ou chuvas torrenciais. De
capturar a paixão em um beijo sob a ponte ou a tristeza dos que vagueiam com o
olhar perdido.
Tenho um amigo, dear Philip, que,
certa feita foi fotografar um templo em Bali e acabou sendo traiçoeiramente
atacado por um macaco que ansiava levar seus óculos. Com a força que só os que
sabem que não podem fotografar sem o auxilio de suas lentes pode ter, o
profissional travou, então, brava luta corpórea com o símio e dele se
desvencilhou com o instrumento na mão, ainda dele — embora tortíssimo.
As you see, my friend, há que
passar por muitas sensações e ter talento transbordante para ser um fotógrafo
de viagem.
Ainda assim, meu caro, em tempos
de tentativas gratuitas proporcionadas pelas máquinas digitais, tenho a
tristeza de sugerir que você cogite, as well, uma segunda profissão para não
ser vencido pela insistência dos amadores. A repetição infinita produz, muitas
vezes, instantâneos de sorte que emprestam a aparência de talento aos mais
desemocionados incapazes. Eles não o farão duas vezes, mas milhões deles
poderão repetir sua façanha, criando a falsa sensação de que todos — inclusive
aqueles que insistem em fotografar a lua ou os fotos de artifício com flash —,
são capazes de produzir obras-primas.
Não: poucos têm essa magia. Mas
menos ainda são os que têm a capacidade de reconhecê-la. Do you know what I
mean?
Fonte: Facebook
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