Fabrício Carpinejar
Quem já não cometeu pequenas e patéticas infrações na
relação? Como roubar a gilete rosa da esposa, que ela usa para depilar no
banho, para corrigir aquele fio solto da barba. Precisa abolir o pelo de
qualquer jeito, no desespero do horário, e não há como comprar um aparelho
novo. Ou alguém que furtou a escova de dente ou pegou o troco na carteira do
outro sem avisar, sob alegação de que depois devolveria. Ou roubou um doce
fingindo que desconhecia a importância. Quem? São naturais delitos do amor,
absolutamente perdoáveis. Não partem da zona escura da personalidade. Não
interferem no curso do romance. São molecagens, travessuras, implicâncias.
O que bate de frente é a agressão silenciosa. Quem esconde o
punho na hipocrisia, quem finge generosidade no beijo e cospe sua agressividade
em segredo.
Até perdoo a deslealdade, até perdoo a mentira. O que não
abençoo com a desculpa é quem maltrata animal. Aquele que não tem câmera dentro
de si para se entregar à consciência. Aquele que, por alguns minutos sozinho,
tortura bichos em situação de fragilidade. Aquele que, enquanto não é visto,
chuta as pernas do cachorro ou arremessa o gato na parede e depois segue
normalmente com as suas tarefas no trabalho, como se nada tivesse acontecido.
Tenho certeza que o agressor de bichos também é capaz de
apertar os braços de um bebê ou insultar um idoso com amnésia. Não há limites
na degradação moral. Algo da devastação fica na memória. O sangue não se esvai
pelo ralo com a mesma rapidez da água.
Não suporto quem se aproveita da impossibilidade da denúncia
para abusar da violência. Explora a superioridade para elaborar maldades. Não
guarda um mínimo de culpa e de compaixão para recuar em seus ataques.
Disfarça-se de cuidador para ter controle dos fatos e
aterrorizar progressivamente as suas vítimas. Covardemente, desconta a sua
raiva em seres vulneráveis, sem condições de se defender e relatar os
atentados.
Mesmo que seja uma agressão repentina: um chute, um soco, um
empurrão. A duração do ato não diminui a sua gravidade. Ali ele enterrou a sua
fé, ali ele se recolheu ao território da impunidade e renunciou a decência e o
caráter de uma vez por todas.
Não darei jamais o meu perdão aos monstros domésticos,
afáveis na aparência e boçais na solidão dos gestos.
Eles acreditam que não serão castigados. Juram que os bichos
são somente bichos e, se não há céu para eles, tampouco haverá inferno para os
seus agressores.
Mal sabem da verdade. Um gato sofrendo não mia, um cachorro
sofrendo não late, na dor ambos são crianças e gemem humanamente.
Fonte: Facebook
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