Martha Medeiros
A já remota cerimônia de abertura da Olimpíada no Rio deixou
claro que música, dança e teatro não são supérfluos, que precisamos de um
Ministério da Cultura forte e valorizado, e que arte também é uma religião.
A arte possibilita a comunicação instantânea entre povos que
não falam a mesma língua e não possuem os mesmos costumes. A arte acessa em
cada um de nós uma emoção que suplanta as mesquinharias triviais e cotidianas.
Traz à tona valores fundamentais, a começar pela humildade. A arte nos
reposiciona: saímos do lugar-comum, transcendemos e passamos a desenvolver um
olhar mais amplo e generoso para o que nos cerca. A arte homenageia nossa
inteligência e nossa sensibilidade. A arte é universal. É feita de mágica,
beleza, espanto. Cala a nossa voz e desperta nossos sentimentos, sem os quais
seríamos pessoas vazias, robotizadas.
Através da arte, nos aproximamos de outras vivências e
combatemos nossos preconceitos. A arte é empática. Elimina fronteiras.
Desconstrói rótulos. Mesmo quando comercial, traz sempre um valor intrínseco. A
arte não tem que atender nossas demandas, não tem que ser “boazinha”, não tem
que ser prática – ela existe para provocar, para desenterrar aquilo que
escondemos de nós mesmos por covardia: emoção dói, por isso choramos. Ela
recupera a inocência da infância, aquele tempo de descobertas, quando nada
sabíamos. A arte formula perguntas, nos devolve o mistério, nos coloca diante
do desconhecimento, que é a única forma de crescer. A arte impõe a
subjetividade como caminho para a evolução.
Precisamos da arte para extrair de nós o nosso melhor.
Portanto, que nossas escolas invistam em aulas de teatro e música, que
mantenham oficinas de literatura, que coloquem o artesanato no currículo, que
não apenas levem os estudantes a museus, mas que também os habilitem a manejar
luz, som, matéria. Sem desprezar o mundo digital, que as crianças voltem a
fazer trabalhos manuais, encontrando uma forma legítima, autêntica e excitante
de criar algo que as personalize.
Não é preciso Deus quando se pode contar com maestros,
bailarinos, compositores, instrumentistas, cineastas, escritores, pintores,
dramaturgos, ceramistas, escultores, designers, atores, cantores, coreógrafos,
malabaristas – e inclusive atletas. Nadia Comaneci foi uma artista. Garrincha
foi um artista. Toda pessoa que consegue transformar o inesperado em poesia –
através de um salto, um drible – reforça nossa autoestima e nossa fé. Se
religião é crer, eu creio na arte. Ela não promove guerras, intolerância,
terrorismo, repressões. Ela apenas retribui nossa crença nela, fazendo com que
acreditemos em nós também.
Fonte: Zero Hora - 14/08/2016
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