Fabrício Carpinejar
O porta-retratos é soberano. De aparência minúscula, engana
a grandeza. Sua composição expressa a réplica de uma fortaleza erguida entre as
nossas urgências e afoiteza.
Repare que é um quadro de mão, a pequena parede levantada
com cavalete na mesa, como que apontando que aquelas pessoas detrás do vidro
são os eleitos de um coração.
É uma trincheira de nossas ternuras, com imagem da esposa,
dos filhos, dos irmãos, dos pais, dos amigos. É o nosso santuário, nossa gruta
de protegidos e protetores.
O porta-retratos sinaliza o nosso pertencimento a um lugar.
Sem ele, somos turistas em nossas casas. Sem ele, podemos partir a qualquer
hora. Sem ele, não temos laços e raízes, não cultivamos a nostalgia um pouco
por dia.
Não custa quase nada monetariamente e, ao mesmo tempo,
guarda o significado de talismã.
Tanto que nas brigas definitivas e separações, o primeiro a
apanhar é o porta-retratos. Não escapa da fúria amorosa, sempre sofrendo quedas
e arremessos, sempre arcando com retaliação do papel e amputações da companhia.
Quando nos odiamos, quebramos o espelho. Quando odiamos um
familiar, quebramos o porta-retratos. O porta-retratos é o espelho que
guardamos para o outro.
Assim como serve para a vingança, também é uma maneira
lírica de jamais se separar do passado, prático para a saudade. Igual a um
travesseiro, fácil de levar ao escritório ou a hotéis. Mantém o tamanho do
bolso de um casaco, caracterizado pela simplicidade e despojamento, perfeito
para carregar junto ao corpo.
Por mais que seja anacrônico, por mais que seja rudimentar,
por mais que seja artesanal, permanece sendo a galeria mais visível de nossas
afeições, com um valor maior do que uma foto de tela no celular.
O porta-retratos é o nosso livro para fotos. Encadernamos
alguém em nosso amor.
Fonte: Facebook
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