"O deputado que faltar sessões da Câmara durante a
Olimpíada será descontado", diz o locutor matinal do rádio. Quem errou? O
redator do programa, que não sabe ou se esqueceu de que o correto é "o
deputado que faltar às sessões" ou o locutor que, mal saído da cama, leu
distraído o texto? Tanto faz. O desprestígio ou mau uso da preposição
"a" já é tal que temo pelo seu futuro na língua.
Os fatos novos com que estamos lidando no país têm levado a
gramática a perder de goleada para as construções mais estapafúrdias.
Jornalistas, políticos e economistas se revezam na arte de cometer batatadas.
Uma das mais frequentes é escrever ou dizer que fulano "faz apologia
a" alguma coisa. Até há pouco, e conforme os melhores autores, fazia-se a
apologia "de" alguma coisa.
E as pessoas que se concentram na Cinelândia ou na avenida
Paulista "em protesto a" isso ou aquilo? Sempre pensei que se
protestava "contra", não "a" o que quer que fosse. São as
mesmas que se acham no "direito a protestar", e não "de
protestar" —não admira que os protestos atraiam cada vez menos gente. O
mesmo quanto às que se mobilizam "em celebração a" alguém, e não
"de alguém". De onde saem esses estrupícios?
Repórteres se referem ao político xis como "aliado
ao" deputado fulano. Como se pode ser aliado "a alguém", e não
"de alguém"? E não se pode acusar o ex-presidente Lula e seus sócios
de "obstrução à Justiça" —mas de "obstrução da Justiça". E
os interrogatórios e prisões de cachorros grandes, "inéditos ao"
sistema judicial brasileiro? Inéditos "no sistema", diriam os mais
atentos.
Sim, eu sei, não passam de filigranas. Como estamos em plena
temporada de "questionar a" qualquer coisa —e não apenas
"questionar" essa mesma coisa–, talvez o alvo da vez seja a pobre e
abandonada língua portuguesa.
Fonte: Folha de S. Paulo - 25/07/2016
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