Fabrício Carpinejar
Existe a tradição feminina de largar uma calcinha na casa de seu pretendente. Para marcar território. Para inspirar saudade. Para criar dependência. Para provocar um telefonema. Para constranger a concorrência.
A calcinha pode aparecer perdida entre os lençóis ou escondida numa gaveta remota ou escandalosa no box do chuveiro.
É o principal fetiche dos contatos de primeiro grau, o sudário do sexo. Já ouvi vários amigos reclamando com orgulho da cilada, alardeando o perigo sensual da artimanha.
O abandono da calcinha é compreendido pela ala masculina como um ato premeditado: até porque não se sai da residência de alguém distraidamente, sem perceber que não tem nada por baixo (para não estragar a visão romântica e diminuir a sua importância viril, ele jamais cogita de que o fio dental era desconfortável e que a sua dona apenas a descartou na primeira oportunidade).
Talvez a mulher idealize que ele fará uma macumba sexual, esfregará a peça no rosto, cheirando o tecido para evocar a entrega da noite anterior ou que é capaz de se tocar a partir da seleção mental e nostálgica das cenas picantes experimentadas a dois.
Infelizmente, diferente daquilo que o culto ao sexo sempre pregou, a calcinha não é bem um presente ou um sinal de que ela se rendeu aos encantos de uma parceria. Não significa compromisso, fissura, dependência química, noivado de tesão, casamento de pele.
Se a mulher realmente estiver apaixonada, por uma questão de lógica, deixará um sutiã. O sutiã é três vezes mais caro do que a calcinha. Demonstra que ela aposta alto na relação - o cara não é apenas entretenimento e uma diária da ilusão.
O cantor Wando, conhecido por colecionar calcinhas, era um amador. Amor mesmo é esquecer um sutiã. A calcinha é muito mais barata.
Fonte: O Globo
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