Charge de Gerson Kauer |
A RESERVA CONJUGAL
A conclusão está, ipsis literis, no acórdão: "o choque de culturas vertido pela antiga tradição familiar japonesa é a causa do fracasso no casamento".
O julgado pôs fim ao matrimônio de um casal de japoneses, moradores de
Porto Alegre, depois de vários meses de brigas no lar.
Ele veio
ao Brasil ainda menino e ela, 15 anos depois, já moça – quando os
costumes orientais tinham sido modificados. Conheceram-se aqui, onde
também casaram. A diferença etária era de 16 anos. Ele ocupava as horas
livres lendo sobre a cultura samurai; ela gostava de teclar no notebook.
Ele
não permitia que ela se relacionasse com vizinhos. Exigia que ela
usasse sempre saias compridas. E quando os dois brigavam e a esposa saía
de casa, não permitia que, no mesmo dia, ela voltasse ao lar.
Na rua, quando caminhavam, ele exigia que ela viesse, na mesma calçada, atrás dele.
“O marido impunha à mulher o jugo da submissão” – contou o
relator, depois de destacar o depoimento de uma testemunha, também
japonesa, que - em fala enrolada - informara que “o conflito conjugal era motivado pela total diferença de pensamentos deles".
O depoimento ainda revelou que "ele era um homem trabalhador e
honesto, mas exigia da esposa, no Brasil, o mesmo padrão de 40 anos
atrás no Japão: proibição de dirigir veículos; não levantar a voz; nunca
sair de casa sozinha". Segundo outra testemunha, "ela é uma mulher moderna, originária dos padrões culturais e intelectuais dos tempos atuais, instrução superior”.
Em primeiro grau, a sentença tinha afirmado que o casamento findara
só por culpa do marido, sendo improcedente a ação reconvencional que ele
propusera contra a mulher.
Na apelação que ele apresentou – e que foi provida pela Câmara – os desembargadores decidiram pela “culpa concorrente, justamente representada pelas profundas diferenças em seus respectivos jeitos de viver".
Quando arrematava seu voto, o relator acrescentou um detalhe revelador:
-
E pelo depoimento dela, fico sabendo que o marido não permitia à esposa
que tomasse a iniciativa das relações sexuais. O próprio marido, ao
depor, admitiu essa reserva conjugal.
Houve um silêncio na pequena plateia e o presidente arrematou:
- Esse detalhe não é para as notas taquigráficas, nem para o acórdão. Vamos ficar só no choque de culturas!...
Fonte: www.espacovital.com.br
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