Charge de Gerson Kauer |
A parte maldita
Na comarca - que tem uma vara só - há um saudável hábito de fraterna
convivência entre os operadores do Direito. Após o expediente das tardes
de quartas-feiras, advogados, juiz, promotor e alguns servidores
forenses se reúnem no clube local para a prática de vôlei ou futebol
sete.
Tradicionalmente o magistrado é jogador; o representante do M.P. prefere atuar de apito à boca.
Um dia desses, o jogo teve que ser interrompido, ante a presença - engravatado - de um advogado que, apresentando a petição inicial de uma medida cautelar, buscava uma decisão liminar. O magistrado leu e despachou ali mesmo, de próprio punho. Concedeu a liminar e autorizou o escrivão - que ficara no foro - “às diligências posteriores e imediatas”.
Tradicionalmente o magistrado é jogador; o representante do M.P. prefere atuar de apito à boca.
Um dia desses, o jogo teve que ser interrompido, ante a presença - engravatado - de um advogado que, apresentando a petição inicial de uma medida cautelar, buscava uma decisão liminar. O magistrado leu e despachou ali mesmo, de próprio punho. Concedeu a liminar e autorizou o escrivão - que ficara no foro - “às diligências posteriores e imediatas”.
A incumbência da autuação e a expedição de mandado etc. foram delegadas pelo serventuário a uma novel estagiária forense, cedida uma semana antes pela Prefeitura.
O escrivão assinou, “por ordem do doutor juiz”, um oficial de justiça foi convocado, o mandado foi cumprido etc.
No dia seguinte, o réu foi a um dos tradicionais escritórios de Advocacia da cidade, brandindo com o mandado de citação na mão.
- Eu aceito ser réu, aceito também a liminar contra mim, mas não aceito ser amaldiçoado pelo juiz - vociferou o cliente.
O advogado logo ponderou que “o juiz é uma pessoa respeitosa, que não amaldiçoa ninguém”...
Dito isso, o profissional da Advocacia passou a examinar o mandado e leu, incrédulo: (...) “Diante disso, defiro a medida cautelar, ante a maldita outra parte” etc.
O advogado logo ponderou que “o juiz é uma pessoa respeitosa, que não amaldiçoa ninguém”...
Dito isso, o profissional da Advocacia passou a examinar o mandado e leu, incrédulo: (...) “Diante disso, defiro a medida cautelar, ante a maldita outra parte” etc.
O advogado foi ao foro conversar com o magistrado (é um desses que
está sempre disposto a receber partes e procuradores e habitualmente,
dois turnos, de segunda a sexta cumprindo expediente forense). E então
esclareceu-se que o texto original da decisão inicial manuscrita referia
“diante disso defiro a medida cautelar ´inaudita altera pars´”.
A estagiária foi chamada. O juiz explicou-lhe a expressão latina, ela justificou-se que era novata, mas fez duas ponderações. Primeira: a caligrafia do magistrado não era fácil; segunda: a culpa final fora do escrivão, que assinara o mandado sem conferir.
A estagiária foi chamada. O juiz explicou-lhe a expressão latina, ela justificou-se que era novata, mas fez duas ponderações. Primeira: a caligrafia do magistrado não era fácil; segunda: a culpa final fora do escrivão, que assinara o mandado sem conferir.
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Desculpas apresentadas e aceitas, alguns meses depois, a ação foi julgada improcedente.
Fonte: www.espacovital.com.br
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