Charge: Gerson Kauer |
Os deveres dos nubentes
A juíza recém empossada dá uma escapada da sala de audiências - cheia
de gente - e vai a uma saleta ao lado para celebrar a cerimônia civil
de um casamento. Ela está a suprir a inexistência, na comarca, de
tabelião e de juiz de paz.
Estão presentes apenas os familiares, todos gente simples.
Inicialmente a magistrada tergiversa sobre a importância do
matrimônio, dirigindo-se a um casal, de meia idade, que está de pé à sua
frente, de mãos dadas.
Pouco depois, o servidor cartorário gesticula discretamente. A jovem
magistrada faz um sinal indicando que ele esperasse. E continua a
oratória, enumerando os deveres dos cônjuges. No final, pontifica,
dirigindo-se ao noivo:
- Senhor João Francisco, aceita casar com a senhora Maria Jaguaribe?
O homem apenas olha para a juíza. Imaginando que o noivo estivesse nervoso, ela repete com voz mais impositiva:
- Senhor João Francisco, aceita casar com a senhora Maria?
O noivo permanece silente. Apenas olha em torno. A mulher também nada diz.
E a magistrada se intriga cada vez mais. Nisso, o servidor recomeça a gesticulação, como a insistir em uma brecha para falar.
A juíza ignora a conjunção e repete:
- Senhor João Francisco da Silva, me responda se aceita ou não casar hoje. Há algum problema?
O nubente parece contrariado, sem nada dizer. A noiva, quietíssima.
Ambos apenas balbuciam algo ininteligível, enquanto olham em direção ao serventuário, que novamente pede um aparte.
- O que é desta vez, senhor escrivão?
- Doutora, me desculpe. É que a senhora não me deu tempo para lhe informar que os noivos são surdos-mudos!
-----
O Romance Forense de hoje foi adaptado a partir de um relato feito no blog do juiz estadual (RN) Rosivaldo Toscano Júnior.
Fonte: www.espacovital.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário