Um apaixonado incorrigível
Nosso intimorato viajante anuncia que pretende ir a Pyongyang, na
Coreia do Norte, com a intenção de passar uma carraspana nos belicosos
líderes locais. Desaconselhado por amigos e por sua prima Guinevere, mr.
Miles parece irredutível em seu objetivo. “Não sei se Kim Jong II vai
me receber, mas a intenção é trocar suas pretensões nucleares por uma
permanente na Disney World. Aposto que ele vai ficar encantado com a
possibilidade de desfrutar indefinidamente de novos brinquedos”,
explicou o correspondente britânico.
A seguir, a pergunta da semana:
Querido Mr. Miles: acabo de voltar de minha primeira viagem à Escócia
e sinto-me como que apaixonada pelo país. Sonho de olhos abertos com a
paisagem das Highlands, os castelos e vilarejos que só imaginei
existirem em filmes. Escrevo-lhe como quem confessa um novo amor. (Mariangela Antonucci, por e-mail)
“How nice, my dear! Você acaba de colocar
no papel uma de minhas mais antigas sensações. Não conheço metáfora mais
apropriada do que comparar uma nova descoberta com um novo amor.
Desde
moço, I must say, compreendi que cada país que visitava era
como uma mulher disposta a desvendar seus segredos. Todas elas
diferentes, como vocês mesmas sempre o são. Algumas tímidas e recatadas –
como muitas das nações orientais –, cismavam em fugir de um primeiro
contato.
Evitavam olhares fugidios, sumiam aos primeiros acordes da
orquestra de um baile mas, aos poucos, iam cedendo. Eu as estudava com o
afinco meticuloso de um pesquisador, tentava entender seus hábitos,
explorava seus caminhos. Até que um dia – don’t ask me when – brotavam as primeiras palavras. Então, só então, eu já tinha o que dizer e, melhor que isso: estava pronto para escutá-las.
Na hora de partir, of course, nosso entendimento havia se tornado tão pleno que a despedida já embutia a certeza da volta.
Outros lugares, as another women, são temperamentais; even frightening, eu diria. Países de alma latina, de sangue quente, são mulheres desse tipo. Atemorizam, sometimes,
os que pretendem entender sua natureza contraditória. São
demasiadamente francas e certeiras em suas respostas. Mas por trás da
fúria que alardeiam, exalam uma sensualidade irresistível. Pedem beijos
arrancados à força, carícias que lanham a pele. Oh, my God, quantas vezes me perdi por mulheres assim.
Há países, as well, que são como uma donzela que se entrega
fácil – ou será que eu é que sou imediatamente seduzido por seu
fascínio? Já no desembarque ela está me esperando e se torna a companhia
permanente do que se supunha uma estadia solitária. De mãos dadas,
acompanha-me nas ruelas e nas pontes, com ela compartilho jantares à luz
de vela. Sua ausência seria a própria ausência da viagem. Do you know what I mean?
Indeed, my darling: sou cúmplice de seus sentimentos, porque
também já passei noites em claro rememorando esses amores; as ruas, as
vozes e os aromas redivivos na insônia mais que bem-vinda.
Há um outro fato, however, que é preciso considerar. Conheci
muitas mulheres nessa minha vida peregrina; gostei de algumas,
apaixonei-me por outras, mas, in fact, amei de verdade a muito poucas.
O mesmo, for sure, ocorrerá com os países. Você talvez tenha se apaixonado pela Escócia (apesar do awful english
que eles praticam) e provavelmente terá gostado de alguns outros países
que visitou.
Mas é preciso continuar viajando, na busca incessante por
amores inesquecíveis. Keep going, my dear.”
Fonte: O Estadão
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