Por Ruy Castro
Você ainda
recebe ou manda beijos no coração? Até há pouco, para alguns, não havia maneira
mais poética de se despedir: "Um beijo no coração!". A mim, sempre
pareceu que um beijo no coração deve ter algo de viscoso e grudento, mesmo que
aplicado numa mesa de cirurgia por uma enfermeira loura e decotada. Outra mania
é a das pessoas que dizem "Inté!" em vez de "Tchau!".
Conheço uma socióloga paulista que diz "Inté!". Tem pós-doutorado em
Harvard.
Se alguém lhe prometer "Vou
dar o meu melhor", pode saber que o melhor do cavalheiro não será
suficiente e você fará bem em procurar outro. Idem se ele lhe contar que
"apostou todas as fichas" em alguma coisa. Claro que ele vai se dar
mal --só um bobo aposta todas as fichas de uma vez. E, se o mesmo sujeito
disser que "ligou o sinal de alerta", é porque a vaca dele já foi
para o brejo e ele está apenas querendo ganhar tempo.
E a nova praga "Como se não
houvesse amanhã"? Rezam os sites de fofocas: "Entre um capítulo e
outro das gravações da novela, Maricotinha foi vista tomando sol no Leblon,
como se não houvesse amanhã". É mentira --sempre haverá amanhã, e ai de
Maricotinha se não voltar ao Projac para trabalhar. E o projeto do Fulano que
conta com o "auxílio luxuoso" do Beltrano? Se alguém está pres- tando
um "auxílio luxuoso", é porque está sem projeto próprio e precisando
aparecer.
"Beijo no coração",
"Inté!", "Vou dar o meu melhor", "Apostar todas as
fichas", "Ligar o si- nal de alerta", "Como se não houvesse
amanhã" e "Auxílio luxuoso" são apenas clichês --expressões que
surgem frescas, mas adqui- rem consistência rochosa e se pregam à língua.
Um dia, desgastam-se e somem, e
já vão tarde.
Fonte: Folha de S. Paulo
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